... "And now for something completely different" Monty Python

Thursday, March 16, 2006

O Amor via Messenger



Confesso que, até há poucos anos atrás, não percebia nada do mundo virtual, vulgo internet, e do que se passa nele. Essas coisas de sites, blogs, conversas pelo messenger, chats, fóruns, buscas, e o diabo a fazer o pino (virtualmente, claro) eram-me de todo desconhecidas. Eu era uma info-excluída, que só sabia mandar e receber e-mails... Sim, porque isso de falar por messenger é recentíssimo (sobretudo para mim) e provocaria um ataque à minha bisavó, que nunca sequer entendeu como é que as pessoas da telenovela não conheciam as pessoas que apresentavam o telejornal (“Mas vocês não são amigos?”,  perguntava ela aos jornalistas, que tinham de lhe explicar que não, as telenovelas vinham de fora... “De fora? Mas não trabalham todos na televisão?” Enfim... Coisas modernas.). 


Agora, uma pessoa que está longe dos amigos, da família, do namorado tem o messenger. Acautelem-se, empresas telefónicas, a vida nao mais será a mesma! Agora, tecatecateca... e uma pessoa, em dois segundos, tem uma conversa amorosa ali à mão de semear. E custa menos (falo de dinheiro, e não de esforço, porque todos sabemos que a maior parte dos homens gosta tanto de escrever como de ir ao dentista... mas enfim, também lhes custa falar, pelo que não nos vamos meter por aí, que não adiantamos muito!)


Este messenger é um achado. Tem uma data de possibilidades. Quando uma pessoa não sabe mais o que dizer (ou quer dar mais emoção à coisa), junta-lhe um smile. Explico aqui aos pouco versados nestas coisas que um smile são aqueles bonequinhos todos giros que lá estão a fazer caretas, e sorrisos e caras de desenho animado tipo “gosto tanto de ti” ou “que raio queres tu dizer com isso?” ou ainda” estou triste hoje”. Dá imenso jeito! As mulheres, por natureza mais dadas a enfeitar as conversas, adoram enviar smiles. Os homens, não. De facto, os homens detestam smiles. É frequente os homens dizerem “não me mandes smiles, amor, que estou a fazer um download e isso faz crash ao sistema.”  Qualquer mulher sabe que ele não quer ser incomodado por umas horas quando lhe manda esta conversa. Um download pode levar toda a noite... Um homem esperto envia logo aquela bem pensada história do download. Uma mulher compreensiva (e ainda mais esperta) finge que não percebe.


O messenger tambem dá para usar microfone. Confesso que nunca usei. Parece-me um bocado ridículo, porque podíamos usar o telefone, se quisessemos ouvir a voz  do nosso amado (este palavreado do “amado” já é um bocado poético para conversas internautas, e ademais, pouco  moderno!...), mas admito que não seria tão barato. Todos sabemos que misturar amor e dinheiro é ainda menos poético do que misturar amor e internet... Na verdade, é, mais ou menos, como matar o amor à machadada. Por isso, vou passar de fininho para outro pormenor.


O que mais gosto no messenger é a possibilidade da webcam. Traduzo outra vez para os não utilizadores. É uma camerazita minúscula que passa a ser o objecto da nossa alegria porque mostra a cara de quem está a falar connosco, lá do outro lado do mundo (no outro computador, pois claro). Ás vezes, deixamos a webcam ligada. Verdadeiras e incontornáveis catástrofes podem acontecer nestes casos: o nosso interlocutor vê-nos com creme para as borbulhas, a lamber chocolate com os dedos ou a roer as unhas. É chato se o interlocutor for o nosso patrão. Sim, o messenger também serve para conversas de trabalho, por vezes. Pelo menos, eu utilizo. Isto para não falar daqueles momentos familiares em que temos o gato a saltar para cima de nós, o filho pendurado no nosso pescoço e o marido a passar de toalha enrolada (vá lá que estava de toalha!). E a webcam ligada, por azar. Por delicadeza, nem nos mencionam o facto.


A webcam, porém, pode ser gloriosamente venerada, sobretudo se estamos separados do nosso mais que tudo durante longo tempo. Vemos aquela carinha (o quadrado de felicidade proporcionado pelo messenger é ridiculamente minúsculo) e oh, que maravilha! Ficamos logo todos melados, sem descolar do pc.


Claro que também há os amores que começam e acabam na net. Esses são mais estranhos. Porque são amores sem aroma (o que seria essencial para mim,e calculo que para muitos... Como se pode saber se se gosta de alguém que nunca tivemos oportunidade de cheirar?!) e sem voz (aquela voz toda distorcida do micro nao conta!). Sem tacto, também. Sem gosto sequer. É um amor feito de palavras escritas e de uma visão distorcida pelos pixels. Mas, neste mundo, há tanta variante de amor como há pessoas. E eu também nunca afirmei que percebia nada de amores... e menos ainda da internet.

Thursday, March 2, 2006

Os Países "Desenvolvidos"


Estavam à espera que vos falasse do Carnaval, mas tenham paciência... É que no país onde, actualmente, estou a viver não se celebra o Carnaval e a coisa passou-me ao lado como se nem existissem balões de água e serpentinas. Isto não é inteiramente verdade, dado que há uma coisa vagamente carnavalesca na parte francófona do Canadá, a que chamam Mardi Gras. Portanto, até pelo nome, podem ver que o Carnaval do Canadá resume-se a uma Terça-feira Gorda.  E só existe no Quebéc, que nem é onde estou.


Carnavais à parte (e a minha vida à parte, que também não vos interessa), já acabou esse rito de fantasia e já podem deixar cair as máscaras. Foi a propósito de máscaras e fantasias que me ocorreu esta ideia sobre os países desenvolvidos.


Todos nós – vá lá, a maior parte, porque de certeza há-de aparecer um iluminado a dizer que nunca teve este conceito entranhado... – pensamos no mapa e, pelo que ouvimos veiculado nas notícias, pelo que aprendemos na escola, pelo que fomos adquirindo no convívio social ao longo dos anos, criamos esta imagem de um certo número de países que chamamos desenvolvidos por oposição áqueles que não o são (ou que o são em menor grau). Claro que há aqui uma interessante escadinha: um português, por exemplo, dirá que a França é um país desenvolvido (ou que os E.U.A. são um país desenvolvido, dependendo da conotação que cada qual entender dar à palavra). Já um cingalês, por exemplo, pode achar que Portugal é um país desenvolvido (escolho esta nacionalidade à sorte, porque na minha profissão deparo-me com muitas e esta situação já me aconteceu; eu cá nunca fui ao Sri Lanka e não sei como se vive por lá!).


Note-se que o “desenvolvido” pode vir seguido de uma adversativa “mas...” se não concordarmos com as posições político-humanitárias dos países em questão. O desenvolvimento não está só patente na economia, que se reflecte imediatamente na qualidade de vida da maior parte dos cidadãos – da maior parte, sim... porque não têm todos carros e não falta gente a dormir na rua – mas também no grau de liberdade de pensamento dos mesmos, na igualdade de oportunidades, etc, e na tolerância que se manifesta para com outras culturas. Isto posto assim, não sei se estes países que “admiramos” serão tão desenvolvidos, com o maior respeito que tenho por todas as culturas... E apontando o dedinho acusador para nós próprios também.


O que mais me faz impressão nos países desenvolvidos é a falta de conhecimento que têm acerca das culturas que eles julgam ser inferiores à sua – a não ser que as achem “giras e muito típicas” para umas feriazitas a contar aos amigos. Assim, o Canadá desconhece  completamente o que será isso de Portugal (Açores então, nem falemos nisso!) e frequentemente pessoas bem intencionadas me perguntam se posso tirar-lhes dúvidas acerca da gramática espanhola. É preciso explicar que Portugal é um país, com língua própria e tudo, ahn? Obrigada. Já sei, os senhores vão dizer-me que a vossa família no Canadá conhece muita gente que sabe tudo sobre Portugal. Como sabem, as comunidades emigrantes, seja de que país forem, vivem em bairros todas juntinhas... Se sairem daquelas zonas, entram num mundo onde Portugal, a Ucrânia, o Paquistão já não existem. Eu vivo onde Portugal não existe.


Outro dia, na zona internacional do aeroporto de Toronto, uma senhora hispânica perguntava ao funcionário se era ali que saíam os passageiros do voo de Cuba. “Isso depende”- diz ele -“Cuba... isso é no Canadá?”. “Não, não! Cuba... a ilha. Sabe, o país!”, responde a senhora, cheia de paciência. “Sei lá, minha senhora, nunca ouvi falar.” “É um país.” “Tem a certeza? Se é um país qualquer, a senhora está no sítio certo; se é um sítio remoto do Canadá, tem de ir para outro terminal.”


A ignorância pelo que consideram, seja de que modo for, inferior... Lamentável. Não vejo como a ignorância corresponde a desenvolvimento. Devia estar a dormir quando passaram a ser sinónimos.


Em Portugal, agora que somos, em tanta coisa desenvolvidos, começamos a comportar-nos assim... para com quem achamos inferior, claro. Porque para com os que nem sabem o nosso nome e onde ficamos no mapa, temos uma reverência canina. Só falta abanarmos o rabo e fazermos ão ão. Nem sei bem qual o respeito que perdemos mais: se aquele que tínhamos por nós mesmos ou que devíamos ter pelo próximo.