... "And now for something completely different" Monty Python

Monday, October 19, 2009

A Dor de Cabeça do Barack

Poucas coisas fizeram correr tanta tinta ultimamente como o Prémio Nobel atribuído ao Presidente Obama. Aliás, poucas coisas fizeram correr tanta tinta ultimamente como o Presidente Obama. O Prémio Nobel e Obama, em termos de popularidade, formaram um caso raro de simbiose na data em que se juntaram. Esta protocooperação é extraordinariamente visível: no meu servidor de e-mail (que não é americano!) há até uma caixa de mensagens para mandarmos os nossos parabéns ao Presidente e a cadeia de televisão BBC, nas suas notícias online, colocou à disposição dos espectadores um fórum onde podemos dizer o que pensamos acerca da atribuição deste prémio. Alguém se lembra do Prémio Nobel ser tão comentado? E, vamos lá, também já vínhamos sentindo falta de uma notícia grandiosa e positiva sobre Obama depois daquelas imagens de cartazes com o rosto dele e a palavra “Hope” (utilizados na sua campanha) terem aparecido na televisão com jovens a escreverem por baixo “less”, formando “Hopeless”. A opinião pública é terrível: num dia, um tipo é um salvador bestial e no dia seguinte é uma besta, passando a bestial outra vez por um “nico” de nada se a coisa for bem jogada. Pois a opinião pública, para além de terrível, nada tem de inteligente – é obtusa, vendável para o bem e para o mal e funciona com base na psicologia das multidões.


Há milhares de milhões de comentários sobre a justiça da atribuição deste Nobel da Paz. O meu seria apenas mais um e não me interessa inculcar a minha humilde ideia. Muito mais engraçado seria discutir uma questão levantada pelo Wall Street Journal que diz que Obama devia ganhar um Nobel, sim, mas o da Economia, pelo seu “Reform Act” na área da Saúde, pelo seu pacote-estímulo de 787$ biliões, pelas questões da General Motors e da Chrysler… Mas eu sou mulher e, como já exprimi aqui, as mulheres não percebem nada de Economia nem de globalização; só podemos dizer aos nossos maridos que estão em falta detergentes e que o orçamento doméstico corre o risco de se afundar. Não é?


Quanto à Paz – que segundo a Revista Maria – é imprescindível para o bem-estar do lar e calculo que também do mundo, cheira-me que foi uma grande estratégia deste comité dar o Prémio ao Sr. Presidente dos EUA. Uma pessoa que recebe o Nobel da Paz não tem outro remédio senão ser mais do que diplomata daqui em diante. Vê-se obrigado a uma ética de base. Acabaram-se os conflitos bélicos americanos no terreno, as declarações de confronto no futuro, as armas nucleares ainda existentes, as penosas sanções a países terceiros, a pena de morte dentro do seu país, etc. Gee whiz. Coitado. Ou aceita ser Nobel da Paz ou segue a actual estratégia da sua super potência. O homem só está lá há nove meses, não pode modificar a política externa e interna só por si, ainda que queira. Alguém se lembra de um tal de Kennedy? Parece que era adorado. Não se sabe é como é que morreu. Alguém acredita nessa patranha do russo que furou a alta segurança americana? Eu, como sou mulher, só me lembro das toilettes da Jackie Kennedy. Lindas. E os chapeuzinhos? Divinais.

Tuesday, October 6, 2009

Meu Professor de Dez Meses

Há algum tempo, escrevi 3 artigos muito fundamentados e académicos sobre os problemas da comunicação. Já a crónica que se segue, retirei-a do meu notebook de viagem, e contradiz absolutamente os dramas linguísticos que, então, se me apresentavam. É bem feito. E, o que é mais, está sempre a acontecer-me. Pagar pela língua parece-me bem quando falamos de questões desta natureza. Aqui vai um pedacinho do diário desta viagem, como penitência.


“Após horas de caminhada por bairros muito estranhos onde não vi uma única mulher, chegámos a sítios da cidade que as cabeças ocidentais denominariam decentes. Vimos, então, uma mesquita e pensei “Que benção!” o que é um pensamento muito estranho para uma rapariga que usa uma Estrela de David ao pescoço desde a infância. Infelizmente, eu não tinha um véu suficientemente comprido. Emprestaram-me um, à porta. Cobri-me e entrei, cansada. Foi então que fiz algo inesperado para uma turista de câmara na mão – larguei-a e fui até ao extremo direito, entrando no rectângulo pequeno da mesquita onde só podem entrar mulheres (e os seus bebés). Tinha um pouco de receio que as muçulmanas me mandassem embora dali, porque é um sítio só delas, e estavam a rezar devotadamente, naquela posição especial que adoptam, com aqueles rosários diferentes. Algumas estavam apenas sentadas, a descansar. Uma tinha um bebezinho, e tentava mantê-lo quieto para que não fizesse barulhos desrespeitosos. Eu tive medo que me considerassem uma intrusa ou, pior!, uma curiosa da pior espécie , tentando escarnecer da fé alheia.


Mas nenhuma das mulheres disse uma palavra. As que estavam a rezar, continuaram. As que descansavam, sorriram-me amigavelmente. Sentamo-nos, eu e o meu filho. Lembrei-me de repente da minha Estrela de David, claramente visível, e que pensariam elas de um símbolo como aquele? Pensei numa fracçao de segundo “Tapo-a? Não a tapo?” Decidi não a esconder. A mulher que também tinha um bebé começou entao a entretê-lo com um tecido brilhante, que ele tentava agarrar. O meu bebé fez o mesmo. Ela olhou-me, com um sorriso radiante. De repente, estávamos a comunicar. Os bebés ainda mais, brincando com as mãozinhas um do outro e com o véu. Ela disse-me não sei quê, baixinho, sobre o véu e os bebés certamente e riu-se pondo o dedo na boca como que dizendo que tínhamos de fazer silêncio aqui. Os bebés riam, eu sorria como ela. Ninguém parecia ofendido.


Gostava de saber turco, mas não sei. Azar. Felizmente, resta-me o saber que não é aprendido, como o riso. Se olhar mais para o meu bebé na perspectiva de aluna em vez de tentar ser tao professora, talvez chegue mais longe.


O tempo das orações chegou e senti que tinha de sair. Quando passei pela porta, o senhor que guardava a mesquita ofereceu-me um balão. Só falava turco e, infelizmente, o meu agradecimento perdeu-se mas sorrimos e compreendemos o essencial. O balão era para o bebé, assim o entendi porque ele o amarrou no seu pulso.





Continuo sem saber em que parte da cidade estamos, e nao consegui descobrir que mesquita é esta. Mental note: deixar de me preocupar com tolices arquetípicas e seguir o instinto. Costuma dar certo. É muito melhor do que essa coisa carunchosa que é a ânsia de tudo compreender por palavras e infinitamente melhor do que o pré-conceito em relação ao que julgo conhecer.”