Recordo-me do cheiro a jasmim que me inundava as narinas quando eu passava, apertando a mão de minha mãe, debaixo dos tornados de folhas que pendiam sobre o caminho de Ziryad, essa minúscula faixa de terra que vai do Boulevard Bougara ao Télémly numa sucessão de curvas tortuosas.
Poderoso e penetrante, o odor do jasmim inebriava-me e eu lutava, apesar das fortes imprecações de minha mãe que apressava o passo, vendo-me diminuir ou parar cada vez que passávamos sob o arco perfumado dessas deliciosas pequenas flores brancas. Quando ela, imprudente, me deixava a mão, eu saltava como um cabrito para agarrar uma das flores, e, por vezes, várias ao mesmo tempo. As suas pétalas, frágeis como borboletas, eram mantidas por mim na palma de uma mão, abrigando-as timidamente com a palma da minha outra mão, e assim formando uma espécie de concha que as protegia do mundo e, ao mesmo tempo, me invadia um pouco mais com o seu perfume.
No Verão, o caminho de Ziryad vestia-se com os seus mais belos trajes. Perfumado pelo jasmim, era também banhado por uma sombra voluptuosa que envolvia quem por lá passava, afastando-o do calor de chumbo que reinava fora desse local. De tempos a tempos, o silêncio era quebrado pelo zumbir de uma vespa ou pelo canto melodioso de um pintassilgo. Desde o início até ao fim, estávamos ali como numa ilha, abrigados da cidade que, a toda a volta, rugia furiosamente, protegidos desse seu barulho, das hordas de carros rolando em turbilhão, cuspindo o seu veneno nas calçadas demasiado estreitas e incendiando-nos as orelhas com as suas buzinas ensurdecedoras. Fazíamos este caminho duas vezes ao dia, pelo menos: de manhã, para ir até casa do tio Walid que morava na Rua Montgolfier, e à noite, para voltarmos para casa. De manhã, os traços da noite ainda tentavam desaparecer. O ar estava ainda fresco e as flores de jasmim, ainda cheias de gotas de água, metralhavam-nos de tristeza ao deixar cair as suas lágrimas nos nossos rostos. Os homens que se cruzavam connosco apressavam o passo para chegar ao seu trabalho no centro da cidade, e alguns deixavam atrás de si um cheiro misturado de delicioso e suave café e de bolos. A minha mãe seguia esta cadência matinal e eu não tinha outra escolha senão acelerar o passo, colocando-me na sua esteira. Não era o momento de preguiçar, de levantar a cabeça para os cachos de jasmim ou de jogar com as pedras como se fossem bolas de futebol! O meu tio, que fora marinheiro, não tolerava atrasos e nem a minha mãe nem eu queríamos afrontar a sua cólera, que seria certa caso a nossa pontualidade não fosse perfeita. Por isso, a manhã não era propícia a passeios. O caminho Zyriad, na sua frescura e humidade, não me parecia ainda livre das garras da noite hostil.
Ao fim da tarde, porém, passava-se exactamente o oposto. Era preciso subir em vez de descer, mas esta subida frequente e, na verdade, dolorosa das ruas em escadas de Alger, assumia um carácter de viagem agradável. Libertos dos constrangimentos do dia, do trabalho e suas obrigações, cada qual demorava o tempo que queria para chegar até ao fim da estrada e entrar em sua casa, como os barcos de pescadores que regressam ao seu porto à hora do crepúsculo. Todos em sintonia, marchando até com alegria, nós inspirávamos os odores, o do jasmim, sem dúvida, mas também todos os outros, os sedutores e até os culinários que se escapavam das casas adjacentes juntamente com os risos das mulheres. Um cheiro de cominho atravessava os muros altos e os ramos espessos para chegar até ali, à sombra do caminho Ziryad, misturar-se com os aromas da bolacha, das sardinhas grelhadas ou das cebolas fritas. Não sabíamos sequer para onde virar a cabeça, tantas eram as sensações das nossas papilas gustativas solicitadas por essa formidável avalanche de sabores doces e salgados que, tal como rios perfumados, traziam tudo o que a imaginação pode conter em pratos suculentos, juntando-se ao grande rio Ziryad onde navegávamos e do qual eu não queria mais sair.
Ainda hoje, o caminho de Ziryad representa, para mim, esse lugar de reclusão deliciosa onde adoro afundar-me entre os requintados cheiros do meu passado e as escuras cores que o habitam, onde sinto ainda a mão da minha mãe agarrando a minha enquanto, sobre as nossas cabeças, se derrama o maravilhoso perfume do jasmim.
N.B.: Este texto foi uma tradução que fiz de um original francês de Karim Amellal, para o suplemento de Imprensa da AIPA dedicado a África: "Cheiros de África".