Porque trabalho para uma instituição profundamente conectada com os EUA,
nas últimas semanas levei um “banho” de eleições presidenciais desse país. À
primeira vista, é irrelevante, mas, na verdade, é muito mais importante Obama
ser re-eleito do que foi importante ter sido eleito a primeira vez.
Quando Obama foi eleito, ficou sempre no ar a possibilidade de ele ter sido
votado não porque trazia melhores políticas, mas sim porque era negro. Por
muito que não seja politicamente correcto dizê-lo, a verdade é que todos os
grupos que um dia já foram minorias – ou melhor, que um dia já ocuparam
posições desfavoráveis na sociedade e
que se encontram, ainda hoje, a tentar justificadamente ganhar a sua posição
igualitária – sofrem deste estigma que os anglo-saxões e o seu humor sardónico
chamam “discriminação positiva”. Ou
seja, há uma espécie de tratamento preferencial dado àqueles que pertencem a
minorias, precisamente porque durante tantos anos foram alvo de uma injusta
posição contrária. Esta discriminação positiva existe nalguns empregos, por
exemplo – aliás, legalmente, é para isso que servem as perguntas (facultativas)
sobre género, etnia e religião que são feitas aquando das candidaturas. O tema
é controverso, mas não deixa de ter apoiantes: se há quem advogue que todo o
tipo de discriminação é errado, também há quem diga que esta é a única forma de
as minorias chegarem ao poder e à igualdade no mundo de hoje, que continua a
ser discriminatório. O ponto é que, aquando da primeira candidatura de Obama,
não faltou quem dissesse que ele fora eleito devido à vontade de uma larga
fatia de americanos quererem um “minoritário” no poder (ou porque eram minorias
eles próprios ou porque se sentiam culpados de serem WASP…) É discutível.
Indiscutível é que não se pode dizer o mesmo quando esse homem é re-eleito. Uma
re-eleição significa sempre o premiar de um trabalho, o renovar de uma
confiança.
A dita discrimininação positiva, porém, acontece em quase todo o mundo
ocidental. Os inuits canadianos e os aborígenes da Nova Zelândia – ambos casos
típicos de minorias severamente maltratadas pelos povos colonizadores – têm uma
quota reservada, isto é, um número reservado de lugares no Parlamento. É uma
espécie de pagamento pelos males passados – que, aliás, pouco compensa em
termos de factuais bens presentes, ao que sei…
Mas não vamos tão longe. A Lei da Paridade em Portugal estabelece que as
listas para o Parlamento (Europeu ou da República) e para as Autarquias “são
compostas de modo a assegurar a representação mínima de 33% de cada um dos
sexos.” Ora, isto, supostamente, vem favorecer a entrada de mulheres na
política. Na prática, os partidos procuram incluir nem que seja uma mulher em
lugar de destaque, não só por uma questão de agradar ao eleitorado feminino mas
até porque já houve multas por não se cumprir esta lei. Mas a questão, quanto a
mim e como mulher, é perigosamente discriminatória – ocuparemos lugares de
destaque por sermos competentes… ou por sermos mulheres e se verem obrigados a
preencher a quota?
Como mulher, continuo a achar que é bem mais fácil triunfar
profissionalmente sendo homem. Não tenho dúvidas. Mas recuso uma discriminação
positiva pelo facto de ser mulher… Parece-me limitativo da afirmação das minhas
qualidades e competências reais.
Aliás, isto recorda-me um episódio da série Yes, Prime Minister em que
membros do Governo falavam sobre a tal discriminação positiva e terminavam
“Todos concordamos com este princípio fantástico que é ter mulheres a governar!
Mas onde as colocamos, Sr. Ministro? Não há nenhum Ministério adequado para um
toque feminino…”
A quota não acaba com o preconceito e não será a quota a mudar mentalidades.