Fiquei sinceramente aflita com a hipótese do Governo poder cair, que chegou
a colocar-se na última semana. Como todos os Portugueses, eu gosto de criticar
o Governo. Sem Governo, a minha vida ficava duplamente mais difícil: não só
continuava nas lonas económicas, pagando impostos brutais por uma educação
deficiente e um sistema de saúde que deixa a desejar, como ainda ficava sem ter
sobre quem fazer humor. Como não temos nenhuma garantia que a oposição fizesse
melhor do que quem governa, visto que o líder da mesma não apresentou até hoje
nenhum plano sobre o que viria a fazer caso se sentasse na cadeira do poder e
apenas se mostra “disponível” para a ocupar (que surpresa!), o nosso destino
nacional é triste. Não há líderes de fibra e ação; há líderes partidários de
umbigo e isso, para mal dos nossos pecados, já conhecemos há vários anos.
Assim, estando nós entre o mar bravo e as rochas no que respeita a
escolhas, os Portugueses viram-se novamente para o velho mito sebástico. Aguardam
ansiosamente por alguém que os resgate, que traga a ressurreição de um país
perdido e seus mitos patrióticos no qual já poucos acreditam – exceto quando
joga a seleção nacional. Recentemente, apareceu a febre de Abril, que mais não
é do que uma forma de sebastianismo, com a interpretação – quantas vezes mal
usada – de uma “Grândola Vila Morena”, que agora serve para tudo, desde
situações efetivamente sérias até protestos contra a greve do metro (que
acontece cada 15 dias…)
Tudo o que cai na rotina deixa de fazer sentido. Já ninguém – muito menos
os governantes - presta atenção às
greves, às canções de protesto (?), às manifestações, também estas convocadas
duas vezes por mês. A luta portuguesa é desorganizada e prima por não ter um
objetivo concreto. “O que queremos? A queda do Governo!” E depois? Novo
governo. E a seguir o que queremos? “A queda do Governo!” Por feitio, o
português é contestatário mas jamais anárquico. Contrariamente à Bélgica,
seríamos incapazes de estar um ano sem governo e fazer o país andar para a
frente. Que apareça alguém contra quem possamos falar, mas que apareça alguém,
por amor de Deus!
O português abastarda a sua luta muito rapidamente. Os humoristas “Homens
da Luta” são disso exemplo: começaram a reviver um passado recente, de
contestação, género novo Abril, e cedo chegaram ao seu próprio programa de TV,
igual a tantos outros, e cuja ideia espremida
é, afinal, que o próprio Abril mais não foi que uma tolice que não
chegou a lado nenhum.
E agora para onde vai a Liberdade? Somos um país onde pensar por si próprio
é crime. Aquele que vai contra a sua instituição, o seu partido, a sua gens é
um ostracizado. Aquele que assume a sua qualidade de ser pensante ao invés de
“ir com os outros” é sempre mal visto e mal falado. Os melhores e os mais
inteligentes de nós são, invariavelmente, contestados, granjam inimizades
várias, não raro são silenciados – por receio de quem governa de que o livre
pensamento floresça, seja contagioso como doença infantil.
Somos, assim, como disse Sttau Monteiro: “um país onde se cortam as árvores
para que não façam sombra aos arbustos.” Cada vez mais o somos. E é triste.
Pois um país repleto de arbustos é uma nação, como direi… cada vez mais
rasteira.