O Japão é reconhecido como sendo o local onde as pessoas vivem não só mais tempo, mas com mais saúde. A experiência média de vida ultrapassa os 80 anos, sendo que a das mulheres é de 90 anos. Na ilha de Okinawa é onde as estatísticas são mais altas. Muitas razões têm sido apontadas para explicar o porquê do Japão, e em particular Okinawa, apresentar estes valores: a dieta saudável, a vida activa, a meditação, a higiene apurada, a preocupação com o cuidado e vida emocional dos idosos, a ingestão de líquidos, a genética. Eu, que sou apaixonada por gatos, acrescentaria a convivência com os gatos, porque Okinawa é repleta de gatos e ninguém me convence que isso não tem certa relação com o assunto da longevidade saudável – mas não encontrarão esta teoria corroborada por muitos, o que não significa que não seja verdadeira.
Existe um importante conceito japonês que contribui muito para a
longevidade saudável e que é uma espécie de “joie de vivre” oriental, mas mais
profunda porque contém em si um compromisso com a vida. Ikigai é a junção de
Iki (vida) e Gai (valor). Por um resumo, Ikigai é o propósito, a razão pela
qual as pessoas se levantam todas as manhãs. Enquanto existir esse motivo
intrínseco, sempre haverá vida – saudável e longa.
Na prática, Ikigai trata-se de encontrar o bem-estar através de uma
complexidade de factores que vou tentar explicar. O esquema faz-se melhor com
um desenho em forma de círculos que se interconectam. Então, vão desenhando
comigo. Em primeiro lugar, “aquilo que o indivíduo ama fazer” interconectando
com “aquilo em que o indivíduo é bom” – estas duas coisas combinam na sua
“Paixão”. Depois, “aquilo em que o indivíduo é bom” interconectando com “aquilo
que o indivíduo é pago para fazer” – estes dois constituem a sua “Profissão”.
Em terceiro lugar, “aquilo que o indivíduo é pago para fazer” interconectando
com “aquilo que o mundo precisa” – estes dois combinam na sua “Vocação”. Finalmente, “aquilo que o mundo precisa”
fecha o círculo interconectando com o primeiro que era “aquilo que o indivíduo
ama fazer” – estes são a sua “Missão”.
Vejamos um exemplo concreto. Imaginemos que a Sra Lin ama ensinar e é
realmente boa a fazer isso. Essa é a paixão da Sra Lin. A Sra Lin conseguiu ser
professora e, portanto, é paga para realizar esse trabalho. Essa é a sua
profissão. O mundo precisa de professores. Essa é a vocação da Sra Lin. Aquilo
de que o mundo precisa combina com aquilo que a Sra Lin ama fazer – a Sra Lin
encontrou a sua missão.
O Ikigai constitui esta sinergia em pleno, ou seja, no aproveitamento
individual da paixão do indivíduo e suas necessidades materiais com aquilo de
que o seu entorno necessita, contribuindo assim para o bem estar geral.
Importante é notar que propósito do indivíduo não pode ser forçado. Como é
óbvio, as paixões não podem ser ditadas por outrem, aconselhadas, impostas,
etc… Ou não seriam paixões! A questão do realismo também tem de ser encarada,
ou seja, podemos ser apaixonados por muita coisa, mas certamente teremos um
talento maior. Por outras palavras, mesmo que gostemos muito de natação, é
improvável que todos sejamos nadadores olímpicos; há certamente um talento que
brilha mais em cada um de nós. Também é importante ressalvar que as
necessidades terrenas do indivíduo têm de ser satisfeitas, porque somos humanos
e não vivemos apenas de bons propósitos e de teorias. Amor e uma cabana só no
cinema e na literatura funciona. Finalmente, é importante combinar a nossa
motivação com a necessidade dos outros. Somos seres sociais e o egoísmo não
favorece o ser humano, nem enquanto indivíduo nem enquanto espécie. Esta última
questão não é de difícil aplicação, ao contrário do que possa parecer. Quase
todos os talentos humanos encontram aplicação e necessidade premente por parte
de outros seres humanos, mesmo que tenhamos de mudar de geografia. Aliás, e
porque não? Mudar de geografia é apenas mudar o rumo da nossa história.
Ikigai nada tem a ver com aquele tipo de conceito de grande brilho
ofuscante que dá a impressão que vai fazer o pino na nossa vida. É apenas uma
noção calma, consistente e realista – como devem ser as revoluções duradouras.
Sim, porque o único lugar onde podemos fazer uma real revolução é na nossa
própria vida. Estas revoluções pessoais impactam – e não é pouco! – as vidas
dos que nos rodeiam. Desejo a todos que encontrem o vosso Ikigai e, caso já
tenham encontrado, que continuem nessa senda. Seja lá o que for que queiram
fazer, que seja uma coisa extraordinária para vocês mesmos.