... "And now for something completely different" Monty Python

Monday, November 30, 2009

Profissões de Futuro

Tendo irmãos e cunhada em idade de escolher profissão, naquele ingrato momento de vida em que ainda pensam que o primeiro emprego que tiverem lhes há-de durar toda a vida, escolhendo-o portanto com muita atenção, dispus-me a ir verificar quais as “profissões de futuro”, não sem antes os advertir que a gente, hoje em dia, muda de profissão frequentemente.


Após cuidado estudo da minha parte, envolvendo pesquisas à escala global (pois já a minha geração aprendeu que a gente tanto está morando no Pico como na Samoa desde que haja emprego) descobri, sem surpresas, que a maior parte das profissões de futuro estão relacionadas com tecnologia de ponta: analistas, programadores, designers. O Homem confia na tecnologia.


Claro que há o reverso da medalha. Tecnologia a mais contribui para um planeta menos natural. Portanto, também temos carreiras de futuro ligadas à protecção do ambiente, embora não sejam tantas como aquelas que hão-de dar cabo dele. De facto, há uma pequena parcela do mundo que quer regressar a uma vida mais primitiva, no sentido de original. Mas mesmo esses não vivem sem blackberries e sem Facebook.


Explorando mais um pouco sobre profissões de futuro, não é de espantar que a taxa de demografia actual aliada às condições de vida e à medicina avançada – que fazem deste um mundo cheio de bisavós com Alzheimer, mas carente de bisnetos – sejam favoráveis a profissões não só de saúde mas também (eu diria sobretudo!) de assistência à velhice. Lares de idosos precisam de mais mãozinhas qualificadas.


Outras profissões de futuro na lista são de limpeza, quer seja da rua (os “senhores do lixo” são os primeiros protectores do ambiente) ou da nossa casa (empregadas domésticas, experimentem fazer greve!). E, claro, essa profissão de limpeza por excelência que é o psiquiatra e o psicólogo. Limpa que é um caso sério e vai continuar a ter futuro no mundo que se avizinha.


Para ajudar a dar cor e verniz à vida, nada como ser esteticista. Esteticistas, massagistas e técnicos de turismo serão procurados no futuro, como formas de escapar à pressão do dia a dia.


E carreiras que em breve vão deixar de existir? Telefonistas e secretárias. Ao que parece, atender telefone, agendar reuniões e viagens já é feito por computadores em muitas empresas. Claro que um computador não tem unhas de gel pintadas de roxo nem mastiga pastilha elástica de balão enquanto nos atende… Como diz um cínico familiar meu: não há nada que chegue à reconfortante poluição visual e sonora que nos dá um ser humano.

Monday, November 16, 2009

O Caso da Mini-Saia Rosa-Choque

São Paulo, uma das cidades mais povoadas do mundo, deu ao Brasil um dos seus últimos escândalos. Parece coisa fingida para aparecer num reality show, se não tivéssemos mesmo visto as inacreditáveis imagens em telejornais (no you tube para os bichos raros que, como eu, não possuem televisão). Facto: uma rapariga de 20 anos, estudante de Turismo na Uniban, teve de sair, certa manhã, da sua Universidade escoltada pela Polícia. Porquê? Facto: uma universidade em peso (e não era pouca gente, vide primeira linha), colegas, professores e staff auxiliar insultava a rapariga com os mais fortes insultos que uma mulher pode ouvir, ameaçava-a de violação, e bloqueava a saída de modo que ela não ia a lado nenhum. E porquê? Facto: a rapariga estava a usar um minúsculo vestido rosa-choque.


Após o choque inicial (o meu, não o da rapariga…), dei comigo a pensar que poderia haver aqui diferenças culturais que estariam para lá de um primeiro olhar e com diferenças culturais não se goza; tenta-se entender. Mas depois… qual quê?! Então isto não é o mesmo país que gosta de dançar o Carnaval na rua semi-nu?


Poderão dizer-me “mas isso é o Carnaval, não é a vida de todos os dias”. Concordo. Há um tempo e um lugar adequados para tudo. Mas garanto também que a rapariga, neste momento tão tristemente endeusada pelos defensores da liberdade como apunhalada pelos moralistas de sacristia, não estava diferentemente vestida de muitas funcionárias públicas portuguesas, neo-burguesinhas, guiando carros flashy (dos maridos) e piscando o olho muito pintado (aos patrões). Esta Geisy de seu nome, falsa loura, sapato alto, unha longa vermelha e vestido “olhem-para-mim” cuja cor não condizia com o tom da unha, falando com aquele tom arrastado de quem já perdeu a ingenuidade mas quer parecer que não, que nos aparece nas câmaras puxando lágrimas, é um produto de fábrica.


A pergunta não é se a menina tem falta de elegância, de bom gosto e de bom senso. Claro que tem. A pergunta é que tipo de Academia (latu sensu) se preocupa mais com as Geisys e seus uniformes do que com as questões que verdadeiramente a deviam interessar enquanto Templo do Saber e Lugar de Formação. Para quem disser que “formar” a Geisy começa na sua aparência, eu diria que, muito mais grave do que o modo como a Geisy se veste, é saber porque raio todos estes professores, académicos, futuros advogados, futuros médicos, futuros jornalistas, etc,  assumem comportamentos tribais e agem como uma multidão ávida de sangue ao ver alguém que não se comporta como “um dos do grupo” de tal modo que a Polícia tem de a retirar de lá. E muito mais grave ainda é verificar como uma simples mini-saia pôs uma Universidade (cabeças pensantes, julgava eu…) a gritar graves acusações de prostituição e extraordinárias ameaças de violação. E, em última análise, uma mini-saia levou à expulsão de uma rapariga da escola no século XXI… Mary Quant, se tu soubesses!


Monday, November 2, 2009

Dura Lex, Sed Lex?

Todos viram “O Pianista” e talvez até tenham deitado uma lágrima com essa comovente história de um pianista polaco-judeu que consegue sobreviver milagrosamente à II Guerra Mundial. È um filme muito bem feito pelo Roman Polanski, um grande realizador na onda mainstream como o foi no cinema independente. O Sr. Polanski já ganhou um Óscar, um Globo de Cristal, uma Palma de Ouro e vários Césares nos mais variados Festivais de Cinema, sendo um dos mais conceituados realizadores do mundo. Foi preso na Suiça o mês passado, apesar da sua condenação por acusações de sexo não consentido com uma criança, a quem drogou, já vir de 1997. Acontece que o Sr. Polanski, ao saber da sua sentença nos EUA, fugiu para a França pois é cidadão francês. A França pode recusar-se a extraditar os seus cidadãos e o Sr. Polanski tem andado fugido até hoje. Mas tem recebido prémios. Por exemplo, o Óscar da Academia foi recebido pelo Harrison Ford em seu nome.


Remexendo mais na história: parece estranho que a menina – hoje uma senhora – tenha levado tantos anos para denunciar que foi vítima de violação e drogada? Talvez. Mas é preciso ter em conta que ela tinha 13 anos e o Sr. Polanski 44, o que lhe dava um grande ascendente de poder sobre ela. Para além disso, ele era já muito famoso na época e ela estava a cumprir ordens da mãe quando foi fazer uma sessão de fotos com ele. Não tenho dúvidas que o abuso de poder possa ser exercido nesta situação.


É invulgar que a senhora venha dizer, ao fim de algum tempo, que “só quer ser deixada em paz e que retira as acusações”? Talvez. Mas se eu andasse a receber 500 telefonemas de jornalistas por dia e não pudesse sair de casa, não tivesse o apoio de ninguém por comparação aos prémios públicos dados ao meu opositor, sabendo que o criminoso podia, como pôde, livremente fugir da justiça (elucidem-me: fuga à justiça não constitui, per si, um crime?!) após ter sido provada em tribunal a sua culpa, retirava tudo o que ele quisesse para poder ir pôr o saquinho do lixo lá fora, sem incómodos.


E não é invulgar que o Ministro da Cultura francês, esse portento do Frédéric Miterrand, diga publicamente que apoia Polanski “pelo seu amor à França, por ser um homem maravilhoso” e “por ter sido, nesta história, atirado aos leões” - afirmações que têm tanto a ver com a sua ética como batatas com mecânica e que nos dão a ideia que qualquer homem de cultura está não só acima da lei como pode violar o próximo a bem da inspiração.


Não é invulgar que a Polónia, terra original de Polanski, tenha uma sentença de castração química para violação de menores mas defenda Polanski, um homem famoso, que afirmou numa entrevista na TV que esta sentença lhe “dava muito mais projecção que um homicídio, porque f… com miúdas é o que toda a gente quer fazer, incluindo o juiz”?


Talvez tenhamos todos de aprender a distinguir entre os artistas, figuras públicas encantadoras, e os seres humanos que habitam dentro deles, ou, como disse Joan Smith, “temos de encontrar a nossa bússola ética e parar de encontrar desculpas para quem viola” os outros e a lei, sejam famosos ou não, admiráveis na sua arte ou nossos vizinhos.