... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, February 4, 2011

Amigos, Amigos...

…negócios à parte. Este provérbio vem da época em que os amigos eram gente com quem se trocava olhares, falas e apertos de mão. Hoje, até os provérbios perderam actualidade. Como diz um Amigo meu (daqueles com A grande), o Facebook dá amigos e o Twitter dá seguidores: um Homem não precisa de mais para ter uma multidão de amiguinhos e companheiros para quase todo o uso – sim, convenhamos que não dá para jogar umas partidas de futebol ao fim de semana, mas já se inventaram uns jogos virtuais onde não entram suor nem abraços pós-golo. E até as figuras conhecidas da nossa minúscula praça ficam mais felizes (e simultaneamente fazem mais feliz um ou outro anónimo aspirante a deixar de o ser) ao colecionar uma extraordinária multidão de gente que não conhecem ou de quem se esqueceram, mas a quem até chegam a acenar na rua entusiasticamente perguntando em seguida, ao cônjuge, “quem é?”


Não sou contra as redes sociais, pelo contrário. São muito úteis para comunicar mais facilmente com Amigos que vivem longe e até para trocar ideias em rede com amigos que vivem perto. Mas aflige-me o modo como estas são mal-usadas ou levadas ao extremo. Para além disso, há dias em que abrir o Facebook é como ouvir a canção Eleanor Rigby – “all the lonely people, where do they all come from? All the lonely people… where do they all belong?”, tal é o volume de mensagens profundamente intimistas e solitárias que lá vejo, misturadas com apelos aos “únicos amigos verdadeiros que têm” (há gente que nunca viu aqueles a quem chama verdadeiros amigos).


Este fenómeno da solidão não é novo e é, provavelmente, um dos maiores problemas deste mundo porque toca todos os outros problemas graves: se falamos de abandono, de delinquência, de maus tratos, de problemas da terceira idade, de problemas juvenis, de doenças, de pobreza, raro é não estarmos também a falar de solidão. A solidão é aquele problema do qual é tabu falar, não só porque não é politicamente correcto e faz as pessoas parecerem muito pouco atraentes mas porque…pst…cheguem mais perto…é contagioso. De facto, “duas solidões fazem uma companhia” é a maior falsidade que já se disse. Esta opinião não é só minha. Para os que gostam que lhes atirem com calhamaços, Nicholas Christakis da Harvard University, James Fowler da University of Califórnia e John Cacciopo da University of Chicago publicaram um estudo no Journal of Social Psychology que explora exactamente o tema. Do estudo – patrocinado pelo National Institut of Aging, que acha que a meia-idade traz solidão agarrada como pó aos livros - resultaram os livros “Connected” e “Loneliness”. Segundo estes investigadores, os solitários são os maiores clientes das redes sociais e, contrariamente ao esperado, a sua solidão não acaba ali, mas sim aumenta e até se espalha a outras pessoas, criando o efeito de “sozinho na multidão”: “as pessoas solitárias alienam as restantes, sobretudo porque querem muito não ser solitários e preferem pessoas aparentemente vibrantes, que lhe dão atenção momentânea, insatisfatória”.



Quando era criança, recordo ver um programa de TV no qual aparecia o então estrela da rádio, António Sala. Telefonavam para lá muitas senhoras que diziam estar muito agradecidas ao Sr. Sala porque passavam o dia sozinhas e ele fazia-lhes companhia com a sua voz. O Sala respondia, com um sorriso Colgate, que a sua função era essa. Função, ou seja, um serviço de utilidade pública. Como as farmácias. A voz do Sala, antídoto para a solidão da dona de casa que pensa que a voz é só para ela, como a moça feia que vê a banda passar na canção do Chico Buarque. Eu penso que, hoje, o fenómeno da solidão, apesar de cada vez se conhecerem mais pessoas, é muito mais complexo. É que grande parte das pessoas ignora o verbo conhecer na acepção das línguas antigas, como o hebraico, onde não há distinção entre “Conhecer” e “Amar”: eu só posso Conhecer aquilo que Amo e vice-versa. Não há aqui lugares a meias-tintas fantasiosas.



Não é solução para a solidão? Talvez não seja. Afinal, se alguém tivesse encontrado um filão para o Amor, já teria enriquecido. Mas, em alternativa, pode-se sempre ouvir um samba, ir à praia e arranjar um cão. Poucos amores são tão incondicionais. Garanto que o cheiro, o tacto e a alegria sincera de um cão por nos ver batem aos pontos qualquer computador.