Em 2010, foi feito um estudo
pioneiro em Portugal: o 1º Estudo Nacional da Saúde Mental, organizado pela Faculdade
de Ciências Médicas de Lisboa, embora dentro de um âmbito de estudo muito mais
vasto realizado pela Organização Mundial de Saúde e pela Harvard University.
O Professor Caldas de Almeida,
responsável pelo estudo no nosso país, diz ter sido “apanhado de surpresa”
pelas conclusões: Portugal é o país europeu com maior número de doentes
mentais, sendo que 43% da população já teve uma perturbação psiquiátrica. Quase
metade! Só no ano do estudo, foram 23% os que foram diagnosticados por um
psiquiatra como doentes do foro (portanto, um em cada cinco portugueses). À
frente de Portugal, só mesmo os E.U.A., que aliás, só nos ganham por 3,4% em
valores globais. Dá que pensar.
O número aumenta assustadoramente
ao assumirmos que a maior parte dos doentes mentais não chega sequer a ir ao
psiquiatra, como admitem os responsáveis pelo estudo. A considerar este grupo
maior (que, obviamente, não entrou na estatística), podemos especular que
Portugal tem uma taxa bastante mais elevada de doentes mentais na sua
população.
Reportando-nos (apenas) aos
corajosos que foram ao médico e que foram diagnosticados como tal – duas premissas
diferentes, claro está -, este estudo verifica que 67% dos doentes considerados
graves nunca chegam a ser prosseguir tratamento, ou “por vergonha” ou por
“ausência de serviços especializados” na sua área de residência. Destes, uma
parte auto-medica-se com ansiolíticos e anti-depressivos cujo efeito é nulo
para a sua condição; o mesmo tipo de medicamentos, aliás, é “tomado por gente
que não necessita deles”. Também não é inusitado ser o médico de família a
tomar conta dos problemas psiquiátricos em Portugal, o que está na mesma bitola
de correcção de ser o neurologista a indicar uma diálise.
No topo dos problemas dos
portugueses abrangidos por este estudo, encontram-se as perturbações de
ansiedade, as depressões, o descontrolo impulsivo e o alcoolismo. Mas muita atenção!
As doenças psicóticas, de relevância e gravidade bem superior, não fizeram
parte deste levantamento. Dada a sua especificidade, serão consideradas apenas
numa segunda fase do estudo. Portanto, não se admirem de não ver aqui nomeadas aquelas
perturbações em que os doentes vivem numa realidade paralela e que colocam os
que com eles habitam a viver um filme de terror. Em traços largos, se juntarmos
(ainda!) mais estes à estatística, concluímos que pouca será a percentagem de
portugueses que não sofre de problemas mentais.
“O padrão atípico [por ser
elevado] de Portugal” não foi explicado pelos responsáveis, embora essa fosse –
quanto a mim - a parte mais interessante do trabalho. Serão causas genéticas?
Pouco provável, visto sermos uma nação de misturas étnicas várias, tanto no
plano diacrónico como sincrónico. Serão causas ambientais? O facto é que os
restantes países actualmente em crise apresentam taxas bem mais baixas do que a
portuguesa (nem chegam aos 10%!) e a vida está difícil para todos. Factores
educativos? O segundo país europeu mais perturbado é a França (18,4%), o que
talvez explique a nossa empatia subserviente face aos
gauleses. Na realidade, desconhecemos “a causa”. Os dados, que em si têm
“implicações políticas” como foi referido pelos responsáveis, ainda não foram
muito destrinçados - na nossa humilde opinião, contudo, os dados não só têm
implicações como ajudam a explicar muitas das complicações…
Porém, não restam dúvidas sobre o
seguinte: somos uma nação de gente
perturbada. Se você que lê este artigo tem a excepcional e improvável sorte de
ter uma família de gente mentalmente sã e ainda se o seu círculo de amigos e
colegas de trabalho comporta pessoas mentalmente sãs… você não é apenas muito
afortunado; segundo as estatísticas portuguesas, o mais provável é que seja
você que está a precisar de tratamento.