Todos os que já viram uma
campanha eleitoral ou, para tornar a coisa ainda mais corriqueira, já
observaram uma “cena de engate”, sabem que não há nada
que encante tanto o público como uma máscara de protector face a um
desprotegido. Trocando em miúdos: aquele que procura seduzir (seja ele uma
empresa, um político ou um simples cidadão) sabe perfeitamente que, se estiver
acompanhado de um velhote, de um bebé ou de um bicho, tem muito mais hipóteses
de se tornar apelativo. É ou não é verdade que os políticos se esforçam por
tirar fotografias dando beijos em velhas e crianças? É ou não é verdade que os
homens sem compromisso adoram passear cães e sobrinhos? É ou não é verdade que
publicidade com seres fofos e carentes é meio caminho andado para prender
corações? É verdade, sim senhor. E, o que é mais, os calculistas que procuram
ser atraentes não o ignoram.
Dar uma imagem de carinhoso e
responsável apela aos mais básicos instintos que nos observam. Ter fotos dos
filhos no escritório e pagar quotas às mais variadas entidades de solidariedade
social é coisa de quem trabalha muito para a sua imagem. Desconfiem sempre de
quem fala muito de ética; não é necessário falar do que se pratica diariamente.
A propósito de bichinhos, uma
história recente impressionou-me. Não recordo nenhum momento da minha vida que
não tivesse sido acompanhado por animais ditos irracionais. É difícil expressar
o companheirismo que se tem com eles e igualmente falar da revolta que se sente
em relação à crueldade que é apenas (mais) um sintoma da insensibilidade
daqueles que a perpetram. E digo “mais um” com justeza, porquanto todos sabemos
que raro é o serial killer que não se entretivesse, anteriormente, na tortura
de animais…
Avançando: a notícia dá conta de
que a Câmara Municipal da Horta abateu cães, “por engano de leitura de um
e-mail”. A história é esta: enquanto
decorria o evento Feira do Mundo Rural, a CMH – que partilha um canil com
a Associação Faialense de Amigos dos Animais (AFAMA) – abateu 7 cães, 3 dos
quais pertencentes à dita associação e ainda cães que se encontravam à guarda
provisória da CMH a pedido da dona, que se encontrava temporariamente
impossibilitada de os ter em casa.
Já sabemos: as Câmaras abatem animais, não é
bonito, tem de ser feito com métodos próprios e na presença de um veterinário,
mas está previsto na lei para prevenir animais errantes e eventualmente
agressivos nas cidades. A AFAMA – que funciona unicamente com voluntários e
posso atestar que trabalham como cães, passe a piada, para tratar dos seus
bichos e ainda dos bichos que a CMH recolhe… - enviou um e-mail à edilidade,
notificando-a de quais eram os animais recolhidos pela CMH demasiadamente agressivos
e, no dizer da AFAMA, “irrecuperáveis”. A CMH não os identificava, porque não
trata dos ditos e, logo, não os conhece. Pese embora o facto de nos dirigentes
da CMH nesta área, haver quem tenha cartão de sócia da AFAMA e não deixe de
utilizar o facto de defender os animais para atestar da sua enorme
sensibilidade às causas…
À conta do e-mail ser mal
interpretado, Goldie, Lobo e Laika (cães da AFAMA) foram abatidos. Abatidos
foram também os cães de quem tinha lá deixado os seus animais temporariamente.
Os animais a serem abatidos, afinal, não o foram… porque foram confundidos com
outros. A AFAMA refere que os procedimentos legais pré-abate nem sequer foram
seguidos pela CMH, que não publicou edital nem contactou a associação; por seu
lado, a CMH diz que seguiu tudo direitinho (apenas ainda não consegue ler
e-mails, apesar de ter gente pós-graduada sentada na instituição…)
Embora a custo, vou abster-me de
opinar sobre a conduta da CMH. O que sei é que um canil municipal e um canil de
protecção aos animais não podem nunca dar as mãos (coisa que, de momento, é da
conveniência da edilidade); que mulheres grávidas esfregaram canis
voluntariamente e não fizeram gala disso nem o usaram para aparecer nos
jornais; que merecíamos políticos que, ao menos, soubessem ler; e que de boa
política só para (a)parecer já estou um bocado enjoada.