Estamos na época delas, geralmente mascaradas de boas vontades: acções solidárias
em praça pública, grandes campanhas de instituições que se dedicam “a aliviar o
sofrimento dos mais desfavorecidos” (”pobre” é tabu), recolhas de brinquedos e
roupas usadas, a generosidade em escaparate de montra, com focos de luz
incidindo para que se torne ainda mais notada.
A caridade de fachada sempre existiu. Mas as novas tecnologias elevaram-na
ao seu expoente máximo. Qualquer rede social, como boa ferramenta publicitária,
serve também para este novo conceito que se chama “O marketing da generosidade”
– se alguém duvida desta noção, basta googlar “generosity marketing strategy” e
verificará que muitas empresas utilizam a generosidade como ferramenta de
marketing, ensinando que parecer é muito mais importante do que ser.
Se o importante é parecer, nada melhor do que chamar a atenção para a
aparência. Os que são realmente bons actores conseguem aparentar um ar bastante
interessado nas misérias humanas (malgré
o seu absoluto desinteresse até pelos que com eles vivem). Os “social media”
são, pois, os canais perfeitos para fazer circular a ideia desta grande
construção com pés de barro que é a generosidade falsa. Por cá, temos muitos
exemplos, mas quase todos pecam pela óbvia natureza – portanto, deixo aqui um
conselho aos nossos falsos generosos (dando-lhes do mesmo remédio): atentem no Facebook
de alguns políticos nacionais.
Nestas coisas, o mestre é Paulo Portas. Apesar de Paulo Portas ser pouco amado,
nenhum soube dar como ele a impressão de que é o maior e o mais querido. Posts
e fotografias cuidadosamente escolhidos dão a impressão de estarmos perante um ser
absurdamente dinâmico e trabalhador, porém atento ao pormenor, e ainda amigo de
todos - as pessoas são “um bálsamo de força”, ele “agradece as opiniões e
conselhos de todos (nós)”, dá graças pelo “apoio e comentários que ainda não li
mas vou agora ler”, e outras coisas que colocam qualquer ser, por mais tolinho
e longínquo do Ministro (desde que com acesso ao Facebook) um imediato seu
correligionário, inchado da sua aparente importância. E isto em todo o país:
Portas adora “as ilhas dos Açores”, acha “lindíssimo” o Alentejo, não consegue
ficar muito tempo longe do centro – todos estamos lá, todos pertencemos a este
largo coração viajante, mas concentrado no que importa. Com tanto elogio
generoso e grátis que faz ao mundo, Portas facilmente consegue o que qualquer
narcisista procura: que o elogiem de volta. Este senhor, essencialmente snob por todas as razões (incluindo
berço mas sobretudo feitio) transmite a ideia de ser um Lula da Silva à
portuguesa, fruto e filho da terra, não tardando que alguns sonhem com ele a
cantar a Grândola.
As fotografias são outra maravilha. Portas sabe que podia ser mais atraente…
Mas tem fotos tão bem tiradas, com um riso tão resplandecente que qualquer um
esquece o seu ar habitual e nada indica aquela vida íntima tão murmurada
(absolutamente contrária a todos os seus preceitos ultra-cristãos). De resto,
para além de rasgados sorrisos, abraços e paisagens, Portas tem fotos “de
equipa”, uma equipa que ele também não se cansa de elogiar, ou não fossem os
colaboradores outra fonte de ego-trip.
Caros cultivadores da aparência, só se pescam peixes se lhes dermos isco. Mas,
já agora, façam a coisa como deve ser. Por sermos pequenos, não somos palco
para amadores.