... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, October 11, 2013

Drs. e Engenheiros

O Expresso publicou um artigo onde aborda o problema da indisciplina no Ensino Superior. Há quase 13 anos que leciono em Universidades e a primeira coisa que me ocorre é: porque é que não se fala disto? É verdade que nunca ensinei nos outros níveis de ensino, mas custa-me que se debata tanto a indisciplina no Básico e Secundário e se remeta o Superior ao silêncio, como se os nossos alunos sofressem uma metamorfose ao entrar na Universidade, que os deixa subitamente maturos e plenos de curiosidade intelectual.

Parece-me que, em Portugal, este fenómeno tem vindo a agravar-se muito. Claro que, neste país, o agravamento da indisciplina no Superior tem também a ver com a extensão deste ensino a toda a gente – sofrendo aqui o risco de me acusarem de pouco democrática… Mas não é isso. O Superior não deve pertencer a uma elite económica; mas devia pertencer a uma elite intelectual. Atualmente, não pertence e as consequências são e serão notórias. Além disso, o próprio Superior sofreu um descrédito – como todo o ensino, mas mais grave. De tanto querer ser acessível, baixou a sua fasquia em termos de conhecimentos. Ora, o perigo de baixarmos fasquias é que temos de as baixar em todas as áreas. Um indivíduo que já não tem de se esforçar para entrar e sair da Universidade nem acredita nessa instituição vai comportar-se de forma mais relaxada ou menos correta (conforme as personalidades). A este propósito, repare-se no comportamento dos estudantes de determinados países versus o dos estudantes portugueses em sala de aula – a Universidade não é mais do que o reflexo do Portugal de hoje.

É comum dizer-se que os alunos não chegam preparados para o Superior. Mas é verdade. Faltam conhecimentos básicos mas falta, sobretudo, curiosidade. Uma boa dose de curiosidade intelectual pode bem suprir uma educação deficitária, pelo que não se pode inteiramente culpar a lecionação anterior. Nos estudantes, há a ideia geral de que “não vale a pena”. É a sensação geral do País: falta de entusiasmo e deixa andar, já que vai tudo cair.

 Além disso, a indisciplina não são só os telemóveis a tocar e os tablets como loucos – são indisciplina, sim, mas são também uma consequência das solicitações do mundo atual e de alguma falta de organização e planeamento (inclusive de quem faz as aulas e que devia também apelar nelas aos benefícios da tecnologia mas também ser rigoroso quanto aos seus limites). A indisciplina é bem mais básica. É o não deixar o colega acabar de falar com o professor para saltar em cima com a sua opinião, é achar que insultos são normais, é fazer manicure na sala de aula, é ter a ideia de que as tarefas de investigação têm de ser todas agradáveis e divertidas, nem que fossem passatempos.

No entanto, o que me parece gritante é a falta de autonomia dos alunos em geral. Há uma grande dependência de pensamento – raros são os alunos que não ficam nervosos quando há questões que pedem a sua opinião e todos preferem testes americanos “de cruzinhas” aos testes com questões relacionáveis e com expressão de ideias. O aluno do Ensino Superior esquece-se que tem de ser, antes do mais, um constante exercício do seu próprio pensamento. Tem medo de pensar mas rebela-se na postura de menino mimado. É o perfeito súbdito da ditadura e não dá por isso.


Mas o artigo é curto e o assunto grande. Para resumir, diria que teríamos de perguntar aos alunos o seguinte, antes de ingressarem: ”Quer mesmo ir para a Universidade?” pois esta reflexão podia acabar com o ar aborrecido de quem está no Superior como se fosse obrigatório… Não temos todos de ser drs, nem somos todos iguais. Os docentes, já agora, também não são todos iguais (fica para a próxima!).