O Expresso publicou um artigo onde aborda o problema da indisciplina
no Ensino Superior. Há quase 13 anos que leciono em Universidades e a primeira
coisa que me ocorre é: porque é que não se fala disto? É verdade que nunca
ensinei nos outros níveis de ensino, mas custa-me que se debata tanto a
indisciplina no Básico e Secundário e se remeta o Superior ao silêncio, como se
os nossos alunos sofressem uma metamorfose ao entrar na Universidade, que os
deixa subitamente maturos e plenos de curiosidade intelectual.
Parece-me que, em Portugal, este
fenómeno tem vindo a agravar-se muito. Claro que, neste país, o agravamento da
indisciplina no Superior tem também a ver com a extensão deste ensino a toda a
gente – sofrendo aqui o risco de me acusarem de pouco democrática… Mas não é
isso. O Superior não deve pertencer a uma elite económica; mas devia pertencer
a uma elite intelectual. Atualmente, não pertence e as consequências são e
serão notórias. Além disso, o próprio Superior sofreu um descrédito – como todo
o ensino, mas mais grave. De tanto querer ser acessível, baixou a sua fasquia
em termos de conhecimentos. Ora, o perigo de baixarmos fasquias é que temos de
as baixar em todas as áreas. Um indivíduo que já não tem de se esforçar para
entrar e sair da Universidade nem acredita nessa instituição vai comportar-se
de forma mais relaxada ou menos correta (conforme as personalidades). A este
propósito, repare-se no comportamento dos estudantes de determinados países versus o dos estudantes portugueses em
sala de aula – a Universidade não é mais do que o reflexo do Portugal de hoje.
É comum dizer-se que os alunos
não chegam preparados para o Superior. Mas é verdade. Faltam conhecimentos
básicos mas falta, sobretudo, curiosidade. Uma boa dose de curiosidade
intelectual pode bem suprir uma educação deficitária, pelo que não se pode
inteiramente culpar a lecionação anterior. Nos estudantes, há a ideia geral de
que “não vale a pena”. É a sensação geral do País: falta de entusiasmo e deixa andar,
já que vai tudo cair.
Além disso, a indisciplina não são só os
telemóveis a tocar e os tablets como
loucos – são indisciplina, sim, mas são também uma consequência das
solicitações do mundo atual e de alguma falta de organização e planeamento
(inclusive de quem faz as aulas e que devia também apelar nelas aos benefícios
da tecnologia mas também ser rigoroso quanto aos seus limites). A indisciplina
é bem mais básica. É o não deixar o colega acabar de falar com o professor para
saltar em cima com a sua opinião, é achar que insultos são normais, é fazer
manicure na sala de aula, é ter a ideia de que as tarefas de investigação têm
de ser todas agradáveis e divertidas, nem que fossem passatempos.
No entanto, o que me parece
gritante é a falta de autonomia dos alunos em geral. Há uma grande dependência
de pensamento – raros são os alunos que não ficam nervosos quando há questões
que pedem a sua opinião e todos preferem testes americanos “de cruzinhas” aos
testes com questões relacionáveis e com expressão de ideias. O aluno do Ensino
Superior esquece-se que tem de ser, antes do mais, um constante exercício do
seu próprio pensamento. Tem medo de pensar mas rebela-se na postura de menino
mimado. É o perfeito súbdito da ditadura e não dá por isso.
Mas o artigo é curto e o assunto
grande. Para resumir, diria que teríamos de perguntar aos alunos o seguinte,
antes de ingressarem: ”Quer mesmo ir para a Universidade?” pois esta reflexão podia
acabar com o ar aborrecido de quem está no Superior como se fosse obrigatório…
Não temos todos de ser drs, nem somos todos iguais. Os docentes, já agora,
também não são todos iguais (fica para a próxima!).