Nas jornadas parlamentares do PSD em Março foi dado o alerta que Portugal
estava em risco “super vermelho” no que à natalidade dizia respeito. Assim
disse Joaquim Azevedo, professor da Universidade Católica do Porto e
coordenador do grupo de trabalho para a natalidade em Portugal. Disso não se
fez lá grande notícia, apesar do professor ter salientado que, a continuar
nesta tendência, Portugal terá sete milhões de habitantes antes do fim do
século. Como razões, apresentou não só a fuga da população activa mas o facto
das mulheres em idade fértil serem socialmente prejudicadas por questões
ideológicas no Portugal de hoje, vide o trabalho e a jurisdição. Ninguém
prestou lá grande atenção. O presente é tão duro que do futuro se há-de tratar
a seu tempo.
Mas, quando anteontem, o mesmo professor deu uma entrevista à Antena 1 e
disse que havia várias empresas em Portugal que obrigavam as mulheres em idade
fértil a assinarem declarações em como não engravidariam durante 5 anos
levantou-se um burburinho.
Logo vieram os teóricos do costume afirmar que tais declarações não possuem
valor jurídico e, como tal, batatas. Isso é irrelevante. O relevante é que as
empresas cometem uma ilegalidade e não são punidas. Além disso, em tempos de
crise económica, as pessoas a muito se prestam no trabalho, desde condições
desumanas a regulamentos ilegais, para conservarem o emprego. É aproveitando-se
desse facto que tais cláusulas aparecem e são assinadas. É também sabendo que
não há dinheiro para ir a Tribunal que depois as empresas se dão ao luxo de
despedir funcionárias caso elas engravidem mesmo – pois todos sabemos que não
há método que funcione 100% excepto a castidade...
Aparte a ilegalidade, há dois factos importantes.
Primeiro, nem o Estado
nem os privados têm o direito de imiscuir-se nas decisões pessoais de cada um,
mormente no “ter filhos”. Isto vem sendo moda (veja-se o caso da senhora a quem
foram retirados os filhos porque recusou o conselho do Tribunal de fazer uma
laqueação de trompas...). Soa tão bizarro como se tivessemos voltado aos tempos
da Inquisição. É, pois, uma questão de Direitos Humanos fundamentais. Segundo,
há aqui uma questão de desigualdade premente. A lei em Portugal estima que, em
caso de divórcio, os homens e as mulheres têm direito aos filhos em parte igual
– é uma lei salomónica: filhos, propriedade e dívidas a 50%. Ora, assim sendo,
muito me espanta que sejam só as mulheres a ter de assinar um papel que diga
que não podem ter filhos! Afinal, está instituído por lei que tanto os homens
como as mulheres “sempre tratam” dos filhos em partes iguais... Portanto, seria
lógico que os homens também assinassem um papel a dizer que não vão ter filhos,
já que, do ponto de vista jurídico, se assume que os pais gozam de licença de
paternidade, têm direito a dias para tirar quando os filhos estão doentes e
põem a sua carreira em segundo plano para tratar dos filhos tanto quanto as
mães. Todos sabemos que assim é, não é verdade? Pois.
Aliás, a última moda é dizer “Nós engravidámos” em vez de “eu engravidei”.
Muito criticada é a mulher que diz “eu engravidei” porque isso destitui e
empobrece o papel do homem. A este propósito, leiam as críticas feitas à actriz
Mila Kunis (“O Cisne Negro”) por ela ter dito que incluir o homem na gravidez
era ridículo e irreal, equivalente a dizer que as mulheres sabiam o que era ter
próstata.
Porém, não assumam que são os homens os primeiros críticos das
mulheres-mães que trabalham. De facto, do que me é dado ver, mulheres cuja
maternidade foi mal conseguida ou é inexistente são as primeiras a criticar as
mães que trabalham e que lá por isso não deixam de ser Mães.
Para efectuar um bom trabalho, não é preciso ser um tipo gelado e férreo, à
laia de Angela Merkel (sei que não é mãe e creio que foi uma óptima opção, a
propósito! Antes isso do que sê-lo por convicção burguesa). Para ser mãe,
também não é preciso e nem é desejável que esse seja o único interesse da nossa
vida. De facto, basta apenas que seja o mais importante.