Certo empresário português disse recentemente que Portugal acreditara que a
“educação para todos” era a receita para o País ser informado e civilizado lato sensu; mas, 40 anos depois,
verifica-se que hoje todos são licenciados e continuam sem instrução [sic].
Não sei se isto é verdade (até porque tenho menos de 40 anos e não sei o
que sejam “passagens administrativas”) mas uma coisa sei eu, por experiência:
os erros de Engenharia e os de Educação pagam-se muito caros e ambos pela mesma
razão. É que depois de estarem construídos os edifícios, sejam eles materiais
ou humanos, é muito mais difícil descontrui-los até aos alicerces para os
refazer do que tê-los feito bem da primeira vez... Além disso, subsistirão
sempre erros da primeira construção.
Penso que foi Martinho Lutero quem disse “Dêem-me uma criança antes dos 7
anos de idade e eu dir-vos-ei em que homem o torno”. Há nisto muito de
verdadeiro. A educação fulcral do “caroço” de um ser humano é bastante
prematura. Quando inicia a escola, não só o carácter do indivíduo está bem
marcado como a sua personalidade já teve tempo para ser moldada por
acontecimentos que fizeram o barro tomar forma. Além disso, cognitivamente, de modo
formal ou informal, já foram exploradas muitas coisas. Na escola, toda essa
matéria pode ser bem ou mal guiada... Mas o que é difícil é esperar que o
ensino superior realize um milagre quando recebe indivíduos já adultos – ou
seja, a Universidade pode e deve abrir horizontes, fomentar curiosidade e
conhecimentos; mas não vai “transformar” diametralmente um indivíduo se a
apetência inata deste para a vida intelectual for quase nula.
Com isto não quero dizer que a educação (no sentido de instrução) não leva
ninguém a lado nenhum – uma conversa fácil com o fantasma do desemprego que a
todos assusta. A instrução não é garantia de nada, hoje em dia, é certo; mas
leva-nos sempre mais longe do que a sua ausência.
Tive esta conversa quando fui assistir à palestra do Ex-Presidente dos
E.U.A., Bill Clinton, na Universidade onde lecciono. Fiquei surpreendida por
ouvir falar Clinton com tanta percepção e agudeza de espírito sobre vários
países, tanto sincrónica como diacronicamente. A inteligência cultural, essa sim,
cultiva-se. Do que ouvi, fez eco em mim a questão da Identidade, questão que
sempre me interessa, pois sou – como dizia Petar Petrov noutra conferência
recente sobre quem vive noutra cultura – “um ser humano traduzido”.
Entre outros, Clinton falou do Human Genome Project (projecto científico
internacional que originalmente nasceu para determinar a sequência base do ADN
humano). O estudo chegou à conclusão que o “genoma” de cada humano é único...
mas 99.5 % do que faz um humano é igual. Logo, o que nos diferencia uns dos
outros do ponto de vista biológico é apenas 0.5%. Porém, os nossos cérebros
estão eternamente preocupados com aquela pequena parte que nos diferencia. E a
razão é simples: a busca humana é sempre pela sua identidade.
A luta por uma identidade, seja pessoal, nacional, cultural, nunca é fácil.
A própria expansão de uma identidade é um desafio. É motivo de orgulho quando
tudo corre bem e é sempre conflituosa quando esbarra com dificuldades - veja-se
o caso da ideia de Europa como um todo único, exemplo perfeito para definir o
“mundo inter-dependente” em que vivemos e cujo segredo do equilíbrio está em
definirmos os termos dessa inter-dependência.
Como disse Clinton, “A identidade é o que nos define. Só há uma coisa mais
importante do que a nossa identidade: é a nossa humanidade comum.”
Imagino que devem estar a interrogar-se sobre o título desta crónica versus o conteúdo. Para isso, também
tenho uma frase de Clinton: “É preciso muito cuidado com os news headlines nesta era da informação.
Às vezes não correspondem nada à realidade...”