... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, August 15, 2014

Gilette Cor de Rosa

Começa quando somos fetos. As nossas famílias (ou quem por nós vela) compram-nos roupinhas a condizer: rosa para as meninas, azul para os meninos e a parafernália de branco, amarelo e verde enquanto não se descobriu ainda o sexo do bebé. Depois, na infância, há todo um ambiente caseiro e social que define o estatuto macho ou fêmea comme il faut. Daí que se dêem bonecas às meninas e carrinhos aos meninos e tanto uns como outros sejam energicamente desencorajados de brinquedos contrários ao seu género, para que as meninas estimulem a doçura e os rapazes a força. Claro que há brinquedos andróginos, como os puzzles e os blocos de construções... Mas mesmo esses ultimamente aprenderam a segmentar o seu público consoante o género. A Lego, por exemplo, deixou de ter Lego unissexo (como tinha); agora tem Lego boys e Lego girls e, surpreendentemente (ou não!), expandiu as suas vendas globais em 25% por causa disso e triplicou o número de meninas que brincam com Lego. Isto porque a opção Girls está cheia de bonequinhas e casinhas fofinhas. Que influenciáveis são as crianças, certo? Errado. Quem compra o produto não são elas...

Os adultos adoram produtos exclusivos para o seu género. Numa pequena volta ao supermercado, reparem como está organizada a secção de higiene: shampoo para homem, shampoo para mulher; lâminas de barbear para homem, lâminas depiladoras para mulher; desodorizante para ele e para ela; enfim, a lista é interminável... Agora, tirem um tempinho e verifiquem como os ingredientes do tal shampoo tão específico são iguaizinhos quer diga Man ou Woman. A razão pela qual raramente se dá por isso é que nem entramos na ala do supermercado específica para o género oposto ao nosso.

Nem só na higiene e beleza isto se verifica. Outro campo vasto é o das vitaminas e suplementos alimentares ou cápsulas para desportistas. Ainda recentemente um anúncio de vitaminas “para homem e para mulher em separado” deixava claras as necessidades diferentes de um e de outro sexo após a meia idade, sublinhando que  “para além de necessitarem de vitaminas para fazer frente às alterações da menopausa, as mulheres necessitam de ter uma mente sempre activa.” Esta deliciosa publicidade não só esquece que a andropausa existe - embora com menos fúria hormonal - como, sub-repticiamente, lá vai dizendo que os homens não precisam de ter uma mente activa depois dos 50.

Mas, afinal, que ganham as marcas com isto? Vendem mais. Os lucros de todas as marcas que fazem distinção de género nos seus produtos são consideráveis, exactamente a partir do momento em que fizeram essa distinção. Além disso, aumentam os lucros não só pelo número de vendas mas também pelo aumento de preços, considerando que um produto específico tem de ser mais caro (apesar de ser igualzinho...). Neste particular, note-se que os produtos para mulheres são geralmente mais caros do que os produtos para homens e não é difícil perceber porquê: de forma geral, as mulheres vão mais às compras. Só que, contrariamente aos anos 50, já não querem comprar produtos que sirvam “para toda a família” (e.g. Pasta Medicinal Couto), talvez porque a noção familiar se estilhaçou completamente. Em boa verdade, isto dava um estudo muito mais profundo.

A febre já alcançou o mundo da eletrónica. A Fujitsu lançou um laptop para mulheres chamado “Floral Kiss”. Tem adornos com brilhantes e flores, horóscopo integrado e é especialmente desenhado para as “unhas longas das senhoras”, esse atributo secretarial de excelência.


Para cativar o seu público-alvo, as companhias apostam também nas embalagens. O velho estereótipo das cores continua a funcionar bastante bem. De igual modo, linhas curvas, flores e texturas suaves estão nos produtos para mulheres; embalagens quadradas, ângulos rectos e, se possível, poucos desenhos e a inclusão de números – os homens acham que os números validam seja o que for – encontram-se nos produtos masculinos.  Ainda assim, é mais comum ver uma mulher usar um produto “for men” do que o contrário, provavelmente pela mesma razão que faz com que uma mulher não se sinta muito chocada por ir ao WC masculino se estiver aflita mas um homem prefere ir a um cantinho da via pública do que ser visto a entrar no WC feminino. Coisas...