... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, June 22, 2018

Imunidade Diplomática



Nos anos 80 e princípio de 90, Boris Becker era o campeão de ténis por excelência: ganhou 13 títulos Masters Series, medalha olímpica de ouro, foi o mais jovem jogador de sempre a ganhar Wimbledon com 17 anos.

Becker tinha um conjunto de qualidades que o fizeram entrar na bolha que o mundo reserva para as suas ilusões. Não parecia agressivo (a sociedade estava farta de tenistas como John McEnroe); chegou a aparecer em causas sociais; tinha um ar tão distante, e com tanta falta de colorido com aquelas pestanas amarelas, que apelou mesmo à publicidade e era fotografado por revistas de moda. À conta de um fenómeno que não é raro nos famosos, tornou-se atraente.

A sua fama declinou quando deixou de ganhar títulos, mas manteve-se por conta da publicidade e histórias da sua vida pessoal. Casou com uma mulher de origem africana, uma união que a sociedade não encarou bem, embora gostasse do contrastante colorido, especialmente quando ambos posaram nus em conjunto para uma revista. A polémica acentuou-se quando se divorciaram e Becker admitiu um confronto físico devido a um episódio de infidelidade. Tudo isto é só uma abertura para o que vem a seguir.

Em 2017, Boris Becker declarou falência no Reino Unido, curiosamente dois meses antes de ser declarado o Head of Men’s Tennis da Federação Alemã. Becker tinha pedido certa soma de dinheiro a um banco privado do Reino Unido, não a pagou e declarou que não tinha quaisquer condições de pagar. Premissa 1: estava falido, estava no Tribunal como réu. Premissa 2: continuava a ser uma estrela na sua terra, e no mundo. E agora Becker, como sair desta? Os advogados de Becker não tiveram dúvidas e fizeram o que qualquer advogado com dois dedos de testa faria: utilizaram a premissa 2 para que Becker se livrasse da premissa 1.

Alguns meses depois, em 2018, os advogados de Becker declararam que as questões em Tribunal estão terminadas porque Becker tem “imunidade diplomática” visto que foi nomeado adido diplomático para o desporto e cultura da República Central Africana na União Europeia.

A primeira coisa que ocorre é “conveniente”.  A segunda é ir procurar ao mapa onde fica a RCA, que, provavelmente, nunca teve na UE tanta importância como tem hoje. Mas eu ainda duvido desta realidade: a RCA serve-se de Becker para ganhar notoriedade na UE? Ou Becker serve-se da RCA para escapar ao Tribunal? Quanto a mim, é a segunda! Aguardo resultados para a RCA, porque até agora quem os obteve foi Becker.

Li o testemunho de Becker (outra coisa negativa é a necessidade de recorrer aos media para estas defesas de caráter), dizendo que tinha aceite o convite “também com intenção de pôr termo a esta farsa criada contra ele”. Por último, note-se que este posto diplomático não existia até agora… não é preciso muito para verificar que foi criado à medida para que Becker o ocupasse!

Imunidade política é conveniente para quem a usa, claro. Mas estas próprias palavras “conveniência”, “uso” e mesmo “imunidade”… não são, por si mesmas, prova de que algo está muito podre?

Thursday, June 7, 2018

Quo vadis Miss América?


O concurso Miss América anunciou que vai deixar de julgar a aparência física. Todas podem concorrer, independentemente das medidas, e não haverá mais provas reveladoras do corpo. Eu abomino concursos de Miss, mas dizer que a Miss América vai passar a valorizar o intelecto e o espírito é mais ou menos como um vegetariano que vai passar a comer bacon com sabor a alface. Temos de ter a frontalidade de não mascarar as coisas e de as assumir como são. Quem quer, participa ou vê; quem não quer, opta por outra coisa.

Estou a falar dos concursos de adultas capazes de fazerem as suas escolhas. Não de outros concursos Pageant que são os concursos infantis, com meninas maquilhadas e em fralda de folhos, bamboleando saltos altos. Este vómito devia ser proibido por lei. Essas crianças não escolheram nada e são vítimas de mães que as vendem nessas exibições. Além disso, esses concursos são uma montra para pedófilos.

Voltando ao concurso de Miss, não posso concordar com a sua existência e regras obsoletas, patriarcais, denegridoras: só podem concorrer mulheres solteiras e sem filhos porque as outras já estão estragadas (já dizia cruelmente certa familiar minha que a única espécie em que a fêmea vale mais depois de ter filhos é a vaca), exibição do corpo feminino em montra como se estivesse num talho em que os compradores escolhem o melhor bocado (continua a metáfora de gado), promoção da competição entre as mulheres e da ideia de que terá sucesso (por um efémero ano!) aquela cujo corpo mais agradar aos homens. Está tudo errado nesse concurso, até as perguntas risíveis às concorrentes em que elas, angelicais, dizem que o mais querem é a paz no mundo e o fim da fome e da guerra. Também eu, o Guterres, e até a claque do Sporting desejamos o mesmo – cada um com a modesta contribuição que se verifica, mutatis mutandis.

Mas não sou hipócrita ao ponto de dizer que estes concursos devem continuar a existir, só que mudando de regras – é isto que se vai fazer. Pretende-se uma Miss América, versão Einstein/ Madre Teresa. Acabam com os desfiles de bikini e vestido aberto, porque “abaixo o corpo”. No entanto, visto que também somos contra a opressão de burkas e afins, interrogo-me como irão as candidatas desfilar? Terão liberdade de escolha? Penso que não. Sem liberdade lá se vão o feminismo e o humanismo.

Pretende-se uma exibição das qualidades intelectuais das candidatas (provas de raciocínio, interpretação? A dúvida consome-me!)  e espirituais (qual a medida da espiritualidade?!). As pessoas menos dotadas fisicamente podem concorrer (quanto mais não seja para sofrerem bullying na internet o resto da vida com memes deste acontecimento).

Esta elevação intelectual a par de uma orientação inclusiva do concurso de Miss não é de louvar… é de rir. Não sejamos politicamente corretos, mas sim verticais e acabemos com os concursos em vez de os transformar numa palhaçada diferente, sem sentido. Entra nesta moda atual de tudo poder ser outra coisa, uma moda perigosa porque vai acabar, em última instância, com o método científico, a lógica, a racionalidade do ser humano. Dou um máximo de dois anos para o concurso Miss América aceitar também homens concorrentes. Afinal, a palavra Miss pode ser tanta coisa se tivermos a mente aberta - e o dicionário fechado.