O concurso Miss América
anunciou que vai deixar de julgar a aparência física. Todas podem concorrer,
independentemente das medidas, e não haverá mais provas reveladoras do corpo. Eu abomino concursos de Miss, mas dizer que a Miss América
vai passar a valorizar o intelecto e o espírito é mais ou menos como um
vegetariano que vai passar a comer bacon com sabor a alface. Temos de ter a
frontalidade de não mascarar as coisas e de as assumir como são. Quem quer,
participa ou vê; quem não quer, opta por outra coisa.
Estou a falar dos concursos de adultas capazes de fazerem
as suas escolhas. Não de outros concursos Pageant que são os concursos infantis,
com meninas maquilhadas e em fralda de folhos, bamboleando saltos altos. Este
vómito devia ser proibido por lei. Essas crianças não escolheram nada e são
vítimas de mães que as vendem nessas exibições. Além disso, esses concursos são
uma montra para pedófilos.
Voltando ao concurso de Miss, não posso concordar com a
sua existência e regras obsoletas, patriarcais, denegridoras: só podem
concorrer mulheres solteiras e sem filhos porque as outras já estão estragadas
(já dizia cruelmente certa familiar minha que a única espécie em que a fêmea
vale mais depois de ter filhos é a vaca), exibição do corpo feminino em montra
como se estivesse num talho em que os compradores escolhem o melhor bocado
(continua a metáfora de gado), promoção da competição entre as mulheres e da
ideia de que terá sucesso (por um efémero ano!) aquela cujo corpo mais agradar
aos homens. Está tudo errado nesse concurso, até as perguntas risíveis às
concorrentes em que elas, angelicais, dizem que o mais querem é a paz no mundo
e o fim da fome e da guerra. Também eu, o Guterres, e até a claque do Sporting
desejamos o mesmo – cada um com a modesta contribuição que se verifica, mutatis mutandis.
Mas não sou hipócrita ao ponto de dizer que estes
concursos devem continuar a existir, só que mudando de regras – é isto que se
vai fazer. Pretende-se uma Miss América, versão Einstein/ Madre Teresa. Acabam
com os desfiles de bikini e vestido aberto, porque “abaixo o corpo”. No
entanto, visto que também somos contra a opressão de burkas e afins,
interrogo-me como irão as candidatas desfilar? Terão liberdade de escolha?
Penso que não. Sem liberdade lá se vão o feminismo e o humanismo.
Pretende-se uma exibição das qualidades intelectuais das
candidatas (provas de raciocínio, interpretação? A dúvida consome-me!) e espirituais (qual a medida da
espiritualidade?!). As pessoas menos dotadas fisicamente podem concorrer (quanto
mais não seja para sofrerem bullying na internet o resto da vida com memes
deste acontecimento).
Esta elevação intelectual a par de uma orientação
inclusiva do concurso de Miss não é de louvar… é de rir. Não sejamos
politicamente corretos, mas sim verticais e acabemos com os concursos em vez de
os transformar numa palhaçada diferente, sem sentido. Entra nesta moda atual de
tudo poder ser outra coisa, uma moda perigosa porque vai acabar, em última
instância, com o método científico, a lógica, a racionalidade do ser humano.
Dou um máximo de dois anos para o concurso Miss América aceitar também homens
concorrentes. Afinal, a palavra Miss pode ser tanta coisa se tivermos a mente
aberta - e o dicionário fechado.