... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, November 22, 2019

O Ecoponto da Sra Ministra


No dia 5 de Novembro, três sem abrigo encontraram um recém nascido no eco ponto dos plásticos em frente à Discoteca Lux. A história é menos romântica do que se conta. A primeira pessoa a ouvir o choro de um bebé vindo do lixo foi João Paulo, um sem abrigo que tinha acabado de voltar da dose de metadona. Disse à reportagem da SIC (14 de Novembro) que ainda pensou que podia estar a alucinar, mas o choro não lhe saíu da mente, razão pela qual foi chamar outro sem abrigo, Rui Machado. Os dois procuraram no lixo, mas não conseguiam chegar ao bebé, que parecia “um boneco”. Foram à esquadra e falaram com o agente que, vendo “sem abrigos da metadona”, os aconselhou a irem ao psiquiatra. Foram completamente desacreditados e até humilhados! A sorte do bebé é que os homens não desistiram e chamaram Manuel Xavier, o sem abrigo que o Presidente da República abraçou efusivamente. Foi Manuel Xavier que puxou o bebé do ecoponto, ajudado pelos outros. Nesse momento, os trabalhadores da Lux já estavam cá fora: um homem puxou do telemóvel para chamar o INEM e uma trabalhadora da discoteca (eventualmente alguém que também merece pouco crédito por parte de uma franja da sociedade) pegou no bebé ao colo, bebé esse que, entretanto, fora embrulhado numas calças que os sem abrigo resgataram do chão. “O bebé precisava de carinho de Mulher e de Mãe” (dixit de João Paulo, o primeiro a dar colo ao bebé) e foi assim que o menino se encontrou nos braços de alguém que lhe ofereceu um casaco e o levou para dentro da Lux, até chegar o INEM.

Já li dezenas de artigos de opinião sobre este assunto. Tornou-se social e politicamente correcto defender a progenitora, que (por também ser sem abrigo – vivia numa tenda com um namorado que ela afirma não ser o pai da criança) tem sido dada como “económica e psicologicamente incapaz”, “sem acesso aos cuidados básicos de saúde de gravidez e parto”, “sem apoios afectivos”, “quem sabe se violada”, “incapaz de se apegar emocionalmente a um filho”, “vítima da sociedade”. Claro que estas opiniões são de pessoas que nunca passaram fome, não viveram na rua, sempre tiveram dinheiro para pagar medicamentos, nunca foram violadas ou nunca pariram num passeio. Aquelas mães e mulheres de entre nós que já passaram por qualquer situação muitíssimo vulnerável – como esta ou outra – sentem-se altamente ofendidas por ler que “qualquer uma nesta situação” o que faz é matar a criança. Porque não é. Há milhões de mães em situações de fragilidade e trauma que optam por outras escolhas, desde ter o filho, entregá-lo para adopção ou mesmo abandoná-lo seja onde for, na esperança de que seja “apanhado” por melhor sorte. Mas matar a criança é, digamos, outro nível. Sobretudo, matá-la com intuito e premeditação, não fruto de nenhum desespero de desequilíbrio hormonal provocado pelo parto (como alguns nos querem fazer crer – um mito urbano conveniente). Esta progenitora já disse que escondeu a gravidez, que planeara livrar-se do bebé assim que o tivesse, recusou apoio de saúde que lhe foi oferecido (o que já foi confirmado pelas equipas médicas que apoiam os sem abrigo, que a queriam levar ao Hospital), que agradece “todo o apoio das redes sociais”(repare-se no estilo) e “pede que aguardem com serenidade o seu destino”. É um belo discurso. Não é uma senhora perturbada. É uma mulher que agiu de forma fria e planeada e que não demonstra nenhum remorso.

Estou de acordo com a Presidente do IAC, Dulce Rocha, que diz que o menino devia ser entregue a uma família. Não estou de acordo com o bando que quer entregá-lo à progenitora. Aliás, esta nunca manifestou tal desejo! Para quê? Para outra tentativa de homicídio? Algum destes ambientalistas de pacotilha já viu e sabe o destino que é dado aos plásticos do ecoponto?

Recentemente, assistimos a gente com responsabilidades em Portugal a aderir à onda de apoio a esta senhora. Há uma agenda por trás deste caso da qual nem vou falar, porque não tenho espaço. Primeiro, tivemos o candidato a Bastonário à Ordem dos Advogados a entregar um “habeas corpus” para que a “pobre mãe” fosse libertada até ao julgamento. Tem graça, visto que não podem aplicar-lhe termo de identidade e residência (ela não tem residência…) mas o Sr. acha que era uma medida possível. Enfim, agora todos sabem quem ele é – quantos sabiam antes disto? Muito mais sério é o apoio que lhe foi prestado pela Ministra da Justiça, que a foi visitar à prisão e se sentiu (cito) “confortada com a ideia que a Administração Prisional está a funcionar como devia [porque) ela está a receber todo o apoio”.

Pergunto: quantos presos comuns recebem a visita de um Ministro? Quantas vezes a Administração Prisional (ou Serviços Prisionais) é assim fiscalizada “in loco”, ademais por causa de um preso, potencial homicida de um menor (a mesma administração fiscaliza os casos de menores) e tem esta cobertura mediática, como se estivesse a ser inspecionada publicamente? Ficamos a reflectir a Quem serve tudo isto…

A Sra Ministra que agora apoia desta forma pública esta progenitora que tentou assassinar o seu filho é a mesma Sra Ministra que já recusou formalmente e frontalmente apoio a muitas mães que protegiam os seus filhos, respondendo (cito) “O Ministério não tem relação com os Tribunais”, [não deve imiscuir-se] “em casos concretos, personalizados”. Não é uma mãe que o diz. São várias, conhecem-se, estão juntas em número e força. É verdade, há muitas mais protectoras dos filhos do que assassinas, embora – lamentavelmente – não recebam apoio mas antes lhes levantem dificuldades de variada ordem. Volto a perguntar: a Quem serve tudo isto?

Falemos agora sobre nacionalidade e passaporte. A progenitora da criança é estrangeira, presumivelmente em situação irregular em Portugal, porque veio com visto turístico, não revalidou e não tem papéis de residente. Esta última questão é importante, pois até agora ninguém se debruçou sobre como atribuir papelada legal a esta criança… Eu – e outros observadores atentos - gostaríamos de saber como pensa o Governo Português resolver este assunto, isso sim, importante, pois legalmente impossível, segundo a lei actualmente em vigor. Seria mais importante resolver a situação do inocente do que a da potencial homicida. Mas isto, ao que parece, interessa pouco. Afinal, o petiz não vota e nem sequer fala.

Senhora Ministra, Senhores Ministros, demais serviços governamentais, são várias as mães e crianças que estão muito atentas e aguardam (pelo menos!) a mesma dedicação e benevolência, com muito maior rigor de Justiça.

Thursday, November 7, 2019

O professor e a violência


Li numa notícia de jornal que uma jovem numa escola secundária de Campo Maior foi agredida dentro de uma sala de aula por um colega. Em consequência dos pontapés no rosto que sofreu, a jovem partiu o nariz e ficou com ferimentos num dos olhos. O agressor tem 16 anos e, à laia de punição, fica suspenso por 12 dias, o que implicará chumbar o ano. A escola garante que, apesar da jovem agredida ser vítima de bullying desde o início do ano, trata-se de um caso isolado no cômputo da escola em questão.

Acaba aqui a notícia, começam as minhas questões.

Todos sabemos que há escolas problemáticas; alguns de nós também as frequentaram. A única figura que pode impedir ou, em caso extremo, que pode parar uma cena de pancadaria dentro de uma sala de aula sempre foi e será o professor. Bem sei que, chegados aos 16 anos, não faltam casos em que o aluno é fisicamente mais forte do que o professor/a professora - aliás, não defendo o uso da força nas escolas em nenhuma situação. É importante que desde o primeiro dia se crie um sentimento de autoridade. O professor (vou usar este género por uma questão de economia linguística) não está ao mesmo nível dos alunos, não é um amigão, embora seja amigo - o que é diferente. Sobretudo nas idades formativas, é importante sentir a autoridade dos professores: sabem mais, têm maior experiência de vida, orientam, guiam. Os miúdos esperam, intimamente, essa postura, e notam de imediato se o professor se interessa por eles e se dedica “a ser mestre” ou não. Muitos miúdos não têm outra figura de proa. Se o professor se demite da sua autoridade, ficam sem referências.

Por autoridade, não me refiro a um domínio baseado no jugo e no medo. Isso, infelizmente, já muitos conhecem e é isso que eles próprios exercem sobre outros nessa forma que agora se conhece por bullying e que não é mais que o espelho do que outro alguém sobre eles mantem. Reconheço que existe alguma dificuldade em manter firmeza e ascendência sobre miúdos difíceis, sem usar de impetuosidade, mas já o vi brilhantemente executado durante anos, sem sequer ser rude.

Em resumo: não concebo esta filosofia que hoje vejo pulular que demite o professor da sua responsabilidade, porque parece recear os alunos. Sempre existiram miúdos conflituosos, não é novidade e nem a adolescência de hoje é mais violenta do que foi a minha. Mas é mais mediática. O professor pode e deve fazer algo desde o primeiro dia de aulas, com a sua atitude, exemplo e intervenção. Se sente que não está à vontade (ou até que não quer ou não consegue ser professor…), todos ali têm um problema.

Outra questão decorrente desta é ser-se furiosamente pontapeado no rosto dentro da sala de aula e isto ser um incidente isolado. Não posso pronunciar-me sobre a escola em questão. No entanto, é curiosa a quantidade de “incidentes isolados” deste calibre que acontecem no país – basta fazerem uma busca na internet e verificam que só neste ano escolar já foram vários. Também não é credível que a primeira agressão de alguém a outro seja um pontapé no rosto, agressão que por si só já exibe um carácter de ataque muito violento e que pressupõe violências físicas menores anteriormente executadas.

Isto, infelizmente, recorda-me um caso que conheço bem em que certa personagem confessou perante a Lei pontapear X, mas era esta a única ofensa que lhe fazia (socos não, empurrões não, apenas a pontapeava com violência quando ela já estava no chão… é verosímil? falta explicar como chegou o rosto de X ao chão!)

A terminar, questiono o porquê de um jovem de 16 anos que parte o nariz a alguém não ser imputável perante a Lei. Aos 16 anos, pode-se casar, pode-se guiar uma mota, pode ir-se preso por cometer homicídio ou um crime que a Lei entenda ser de gravidade, mas não se responde sequer à Justiça por partir o nariz a alguém perante uma sala cheia de testemunhas. Não. Fica-se sem escola durante 12 dias (quiçá uma bênção!) e depois retorna-se à vida normal.

Crianças tão jovens como 3 e 4 anos são ouvidas em Tribunal em Portugal, caso tenham sido vítimas de crimes ou presenciado os mesmos. Os interrogatórios são ridículos, feitos como se estivessem a ouvir criminosos adultos, com direito a intimidação e contra-interrogatório. Mas um tipo de 16 anos, que – para todos os efeitos – cometeu uma violência gratuita, tem 12 dias de férias. Portugal seria cómico se não fosse trágico. É um país bom… para férias.