Na época da minha avó, as pessoas namoravam-se à janela. A minha avó
conheceu o meu avô quando ele passou na rua e ela estava à janela. Eu costumava
fazer troça deste evento, dizendo que, caso eu ficasse uma tarde à janela,
jamais conheceria alguém. Continuo convicta disto. Porquê? Porque o mundo tinha
mudado e, dentro do paradigma socio-cultural vigente, já não fazia sentido ir
para a janela esperando encontrar um amor, porque ele não passaria – o mais
certo era o amor estar ocupado no café, no ginásio, etc.
Posteriormente ao fulgurante raio que os fulminou naquele cruzar de olhos
na rua, a minha avó e o meu avô namoraram vários anos por carta, sem se verem,
mas trocando fotos, palavras e promessas incandescentes. Não encontro grandes
diferenças entre isto e os namoros virtuais de hoje em dia, onde se mandam
mensagens, fotos (de estilo certamente mais ousado!) e colmata-se a implacável
distância geográfica com vídeo-calls, onde se faz tudo o que passa pela cabeça.
Não é a cartinha perfumada do antigamente, mas o resultado eufórico nos
participantes e a promessa do “estou aqui para ti, espero o dia em que te possa
voltar a ver” mantem-se.
O ser humano vive de objectivos. Antigamente, as pessoas tinham como
finalidade o casamento. Qual é o objectivo hoje? Não vou responder, porque há
sociólogos que escreveram sobre o desnorte das relações amorosas actuais (por
exemplo a icónica Eva Illouz). Vou apenas debruçar-me sobre terminologias que
apareceram na minha geração e não existiam antes para falar de situações que
acontecem nos relacionamentos, e que “viraram moda”.
A primeira palavrinha é “ghosting”. “Ghosting” designa o acto de desaparecer
subitamente da vida do ser amado. No sábado estava tudo bem, no domingo o tipo
foi raptado por extraterrestres, ou seja, desaparece sem explicação. A parte do
“sem justificativa” é importante, pois quem dá explicação não se qualifica como
“ghosting”. O “ghosting” implica que o ser amado deixa de aparecer, telefonar,
mandar mensagens, enfim, evapora sem dizer o porquê. Nem “adeus”. Esta atitude,
que é cada vez mais comum, tão comum que já ninguém estranha, pode ser final ou
durar meses. Passados meses, o tipo aparece como se nada fosse (a isto chama-se
“submarining”), e caso lhe perguntem o porquê do desaparecimento, ele, natural,
diz que necessitou de fazer um retiro espiritual no qual jamais deixou de
pensar em vocês. Como vocês são telepatas, deviam ter percebido. Na geração da
minha avó, isto chamava-se “despedida à francesa”, portanto não é novo.
Cobardes sempre existiram (com o devido respeito aos franceses, por quem tenho
apreço e linha familiar).
Outra palavra é “breadcrumbing”, que significa não dar muita atenção a um
parceiro, mas lá o ir alimentando com mensagem ali e beijo acolá, tudo muito
ocasional e leve. Nada que dê azo a grandes coisas, mas o suficiente para que o
dito fique com o interesse em alta, e continue a ser um contactinho que não
caia, porque sabe-se lá o futuro. É necessário ter a agenda cheia, caso se
venha a necessitar de uma almofada, sobretudo se cairmos da cama onde estamos.
Portanto, esta é a jogada do egoísta.
Depois existe o “orbiting”, que é quando o tipo não tem coragem de falar
contigo, nem sequer por telefone, mas põe “likes” e corações em tudo o que
publicas nas redes sociais. Ficas assim a pensar o que raio ele quer, mas ele
não diz. Ele está sempre presente, mas na verdade está ausente. Novamente, o
uso da clarividência é necessário. Ou então, um belo chuto no rabo.
Existe ainda o “cushioning”, que é quando estás a pensar terminar com
alguém mas, antes da estocada final, começas a olhar para as outras hipóteses
que existem na praça. Ou seja, o cushioning não é almofadar a vida da pessoa
com quem vais terminar, não. É amparar a tua saída com um colinho fofo que já
esteja pronto para beijinhos. Quem faz isto, faz “roaching”, ou seja, esconde
do companheiro que anda a pescar outros.
Podes também ser deixado em “benching”, literalmente “no banco”, o que –
como qualquer adepto de futebol compreende – não é situação boa de estar. Não
jogas, mas pode ser que venhas a participar caso te chamem. Sabe-se lá quando
ou se. Porém, és claramente uma opção.
Existe o “LOR”, que é “Left on Read” – é quando o caramelo leu as tuas
mensagens e não respondeu durante dias. Mas leu. O processo cerebral está a
pensar se deve responder-te, porque S. Alteza é ocupado. Ou então é para
aumentar a tua ansiedade e submissão.
O dicionário continua, mas o meu espaço está a chegar ao fim. Porém, deixo
aqui a pérola do “Zombieing”, que não desejo a ninguém: é quando um terrível ex
ressurge, qual morto-vivo. Pelas almas! A minha avó não tinha de lidar com
estas nomenclaturas!