Há anos atrás, quando alguém falava de “energia”, isso soava a algo mágico, como se fora um truque circense ou um passe de feitiçaria. Hoje, porém, essa palavra “energia” já entrou no quotidiano rotineiro. Com a expansão científica do século XIX, a ideia de “energia” passou a ser associada ao progresso industrial, usado para o conforto do ser humano. Desde a energia elétrica à das ondas, todas eram capazes de contribuir para o bem-estar, aproveitando as forças da natureza. Mais tarde, descobriram-se outras energias, mais rebuscadas, ou até mais explosivas, caso da atómica – também chamada nuclear. Com tal força, surgiram os protestos, as energias renováveis versus as não-renováveis, e a ideia empírica de “boas energias” e de “más energias”.
Mas essa ideia não era peregrina. Voltando aos tempos antigos, onde as
energias eram tidas como mais místicas e menos palpáveis, também a ideia de
“bom” e de “mau” campo energético existia.
Actualmente, vivemos tempos onde a ciência pura e dura nos falhou enquanto
redentora da Humanidade. Basta olhar para estes tempos de (pós?) pandemia.
Porém, sem ciência ninguém vive, sobretudo sem tecnologia. Então, quando hoje
falamos de “energia”, as forças invisíveis que nos ocorrem primeiramente são
aquelas que nos fazem comunicar à distância, através de telefones celulares,
internet, etc.
Porém, cada vez com maior intensidade, temos uma perspectiva metafísica da
palavra “energia”. É comum usar-se hoje a palavra num sentido espiritual para
referir certa força interpessoal ou essência única não-física do indivíduo,
equiparável ao conceito de “alma” que ainda há pouco era o mais popular. Para
tratar esta energia e as suas maleitas, vivemos hoje uma panóplia de serviços
(dependendo da cultura e do país), desde Acupuntura, Aromaterapia,
Kinesiologia, Reiki, terapia termal-auricular, Hipnoterapia, Óleos essenciais,
TFT, jóias iónicas, meditação theta, florais, cupping, cristaloterapia, e
dezenas de outros que eu levaria páginas a enunciar.
O negócio da medicina energética é fértil, diria mesmo que é o mais fértil
deste século – por uma razão muito simples: primeiro, porque a esmagadora
generalidade das pessoas não se sente bem, ou, em última análise, sente que lhes
falta algo para atingir o máximo da plenitude; segundo, porque o ser humano
está descrente dos tratamentos ditos tradicionais e, sobretudo, da terapia da
alma e das terapias psicossomáticas tradicionais. Os psicólogos andam a perder
terreno. Os imunologistas também. Isto porque já quase ninguém acredita nas
suas abordagens demasiado massudas e puramente académicas. As pessoas querem
resultados da Nova Era para estes mal-estares, da alma e do corpo, que estes
novos tempos apresentam. Hoje em dia, vivemos tempos em que até o
fisioterapeuta recomenda ioga ou tai-chi, e raro é o psicanalista que não
indica meditação e exercícios respiratórios. Estamos todos virados para esse
conceito de “energia” que pensamos ser novo, mas é mais antigo do que os nossos
bisavós.
O que é essa energia transcendente? Para os asiáticos, “qí” (que, em português,
se lê “chí”) corresponde a essa força vital, também vista como a força da vida.
Tudo no mundo é composto de “qí”, desde o corpo físico aos sentimentos que
experimentamos. Um desequilíbrio físico ou emocional provoca uma alteração no
“qí”. O simples retorno a uma vida saudável leva à reposição do “qí”. O
problema é que raras pessoas têm uma vida saudável – seja a nível corporal seja
psíquico, quanto mais em ambos. Tudo no nosso ambiente também é composto por
“qí” – daí as formas de harmonização de ambiente, como o feng shui ou mesmo a
relação interpessoal através das artes marciais e meditativas. Mas isto é só o
início de todo um leque de actividades que permitem a manipulação do “qí”, como
se faz na acupuntura através dos meridianos. Além disso, neste mundo, também há
o “qí” negativo, cujo curso é passível de ser mudado. Para tal, os asiáticos
utilizam armas tendencialmente mais místicas, como seja a geomancia e outras
artes divinatórias.
Energia, em si, é um conceito da Física, inegável e inescapável. É uma
propriedade quantitativa e mensurável em joules, algo de que todos os seres
vivos necessitam. Todavia, para quem acredita no que os olhos não vêem, energia
é mais do que isso. Nas palavras do místico cabalista Isaac Luria, todo o nosso
mundo sofre mudanças de renovação de energia – algo que nós, meros humanos, não
somos capazes de ver, mas sentimos impercetivelmente, quando as civilizações
passam de certo estado letárgico ou até comatoso e renascem como se bebessem da
fonte original.