... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, January 8, 2010

Pausa

Quando perguntaram ao famoso pianista Arthur Rubinstein como fazia para manobrar as notas com tanta mestria, ele respondeu: “Caríssimo, eu jogo com as notas como qualquer outro. Mas as pausas… É nas pausas que reside a arte!” Passe a modéstia de Rubinstein, a verdade é que as pausas são sub-valorizadas, na música como na vida.


Um workaholic, por exemplo, não consegue fazer pausas do trabalho o que, intimamente, significa que é um ser incapaz de relaxar em toda e qualquer situação, incluindo o tal trabalho, que ele jura ser compensador mas onde está tão obssessiva-compulsivamente envolvido. O nome clínico desta doença é ergomania, traduzido por mania de trabalhar. Para aqueles que estão a pensar que isso é bom, relembro que, em grego, mania significa loucura.


No fim dos anos 60, no Japão, começaram a aparecer os primeiros casos de que há memória de morte por excesso de trabalho. Aliás, o Japão é o único país – que eu saiba – que apresenta estatísticas para esta estranha morte, que denominam karoshi. Acontece que, nessa época, apenas operários morriam de karoshi… Quando, nos anos 80, começaram a morrer executivos, a Universidade de Tóquio – muito prestigiada e de onde já sairam mais de uma mão-cheia de Prémios Nobel - prestou atenção ao fenómeno e decidiu estudá-lo. Deixo para os sociólogos e economistas a observação da doença enquanto consequência de todo um espectro de país devastado pela Guerra e com uma brutal energia para ressurgir em grande (?) e para os analistas políticos a força da filosofia do comunitarianismo (ética dos poderosos, será?)  na influência do pensar destes viciados.


Facto é que centenas de pessoas, nos dias de hoje, morrem de estafa, sem sinais anteriores de doença. O perfil típico é o de um homem com boa posição, que trabalha mais de doze horas por dia e sete dias por semana. Pois, mesmo que vá para casa, verifica-se que não consegue deixar de trabalhar… E muitos só vão porque a família os foi buscar aos empregos.


Nem todos os viciados no trabalho morrem. Aparentemente, muitos ficam apenas com severos problemas mentais e de memória (escusado é dizer que todos apresentam graves questões a nível de relacionamentos pessoais). O terrível paradoxo é que estas consequências individuais acabam por afectar o seu rendimento e fazê-los ter de trabalhar cada vez mais, dando origem a um ciclo de quanto mais trabalho, menos produção.
Hoje, no Japão, já inventaram um jogo de computador em que o propósito final não é sobreviver. É matar-se… de cansaço. Chama-se Suicide Salaryman. É precisamente a pergunta que me ocorre: qual é a diferença entre este karoshi e o suicidio a fogo lento?


Nota: Este artigo foi re-publicado a 30 de Julho de 2010 no A.Marginal.