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Friday, January 14, 2011

Quando o Mar Galgou a Terra - Armando Côrtes-Rodrigues

Tradicionalmente, Portugal é um país de poetas, depois de prosadores, mas não de dramaturgos. Não são muitas as peças de escritores nacionais de renome que alcança(ra)m projecção. Porém, Armando Côrtes-Rodrigues constitui uma dessas excepções. Quando o Mar Galgou a Terra foi publicado em 1940 e conta a história da mulher de um pescador, que tenta defender a sua honra perante a tentativa de sedução de um proprietário rural. É a força e bravura exaltada dos personagens que configura carácter ao enredo – que, por si só, seria quase banal. A peça foi de tal modo cativante que motivou uma adaptação para cinema no ano de 1954, quando os Açores (ainda) não estavam na moda para os cineastas portugueses. Foi assim que o galã do cinema português da época, Curado Ribeiro, veio protagonizar para a Ilha de S. Miguel um filme que retratava os costumes duma realidade insular, apegada à religiosidade, ao seu folclore e a uma espectacular e exuberante natureza. Um sucesso a preto e branco, cujo argumento era do próprio Côrtes-Rodrigues, e que contribuiu para fazer de Açores um sinónimo de “gente de coragem”.




Armando Côrtes-Rodrigues (1891-1971) foi um micaelense que chegou a fazer parte do grupo de Orpheu, onde assinava com o pseudónimo Violante de Cysneiros. Apesar disso, o seu Modernismo foi sempre muito moderado, dando a mão à tradição lírica e às especificidades da sua terra, para onde regressou depois de terminar estudos. Sócio fundador do Instituto Cultural de Ponta Delgada, continou a corresponder-se assiduamente com Fernando Pessoa. Mas o forte apelo açoriano – com a sua mitogénese, ambiências, padrões e arquétipos – falou mais alto que a influência do amigo. Mais do que elevar a arte da Pátria ao Mundo, Côrtes-Rodrigues pretendeu louvar os ilhéus e, sobretudo, desvendar a alma popular, o que fez mesmo através de estudos etnográficos e de uma importante recolha de poesia popular. A evocação das suas raízes na vertente poética valeu-lhe o Prémio Antero de Quental em 1953 por Horto Fechado e Outros Poemas. Hoje, a última casa que habitou em Ponta Delgada é-lhe dedicada como Espaço Cultural.