... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, November 25, 2011

A epidemia da doença mental


Li no jornal o caso de uma menina de 12 anos que tinha sido adoptada e foi devolvida porque os (então) pais adoptivos, moradores em Lisboa, dizem que ela “sofre de esquizofrenia grave”. Não faço julgamentos sobre a vida íntima, mas há mesmo que levantar a voz neste caso. O casal teve a menina em sua casa menos de um mês, altura em que percebeu que ela “fazia teatrinhos e falava com amigos imaginários, era demasiado tranquila e isolada e tinha dificuldade em criar laços emocionais”. Finalmente, decidiram-se a falar mais intimamente com ela e foi quando, dizem eles, a menina confessou que “falava com a irmã gémea que morreu mas que continuava dentro dela e ouvia vozes dentro de si”. O casal, a beirar o meio século e com idade para ter juízo, diz que percebeu “num fim de semana” que havia ali um quadro de esquizofrenia, contactou a instituição onde a menina vivera seis anos e foi informado de que “ela não tinha nenhum quadro clínico, mas tomava um psicotrópico, que é dado a casos de esquizofrenia ou de dupla personalidade.” 

É só a mim que isto me parece um caso de Polícia e não de Psiquiatria? E, caso seja de Psiquiatria, o paciente não é, de certeza, a menina de 12 anos!...
Não vos parece normal o isolamento inicial de uma menina que chega a uma casa estranha, habitada por estranhos? Não seria invulgar que ela criasse laços emocionais em tão pouco tempo? Não é saudável uma criança brincar aos teatrinhos? Não é comum às crianças e aos adultos terem saudades dos entes importantes da sua vida que já partiram e sentirem-nos como se continuassem presentes dentro de si? No caso concreto, isso será tanto mais exacerbado quanto essa pessoa importante e falecida é provavelmente o ideal de família e estabilidade desta criança e, portanto, bem se pode compreender o que essa perda representou. “Anormal” e, seguramente, sem sentimentos, seria o ser humano que não se sentisse perdido e só.

O que me parece invulgar aqui são outras duas coisas. Primeiro, estes “pais” que não viram nenhuma destas evidências e que, pelo contrário, esperavam uma menina perfeita e pronta-a-usar, que respondesse com um abraço quando se carregasse no botão dessa “função”. Depois, a leveza e irresponsabilidade com que eles diagnosticam um problema severo em dois dias (já não se entrevistam os proponentes a adopções?). Segundo, a instituição que administra, com a mesma displicência, psicotrópicos a crianças.

Não é por acaso que a esquizofrenia é detectada no início da juventude (isto é, depois de terminada a adolescência). É precisamente porque, antes disso, as respostas emotivas bizarras, os pensamentos desorganizados, as alucinações, as falsas crenças e a falta de distinção entre o real e o imaginário que caracteriza a doença não podem ser facilmente destrinçados da vida usual de um adolescente com hormonas saltitantes e muito menos da de uma criança, em cujo mundo a fantasia desempenha um papel preponderante na aprendizagem e quantas vezes de saudável escape (ao contrário do que devia acontecer na vida adulta). Só depois da passagem para esse mundo cognitivo e emocional adulto se podem determinar que certos processos de pensamento desintegrado ou de descontexto emocional são esquizofrénicos. Antes, poderão ser simples brincadeiras, fases de crescimento, etc, etc.

Para além disso, o uso de psicotrópicos em quem quer que seja tem efeitos severos. São drogas fortes que actuam no sistema nervoso central, elas próprias alterando o comportamento, o humor e a cognição, quantas vezes de forma negativa. Todo o psicotrópico cria dependência. Como diz um psiquiatra que é tio de um bom amigo meu: “Se fores são mas tomares estes remédios, deixas de o ser em pouco tempo.” Posso imaginar o efeito pernicioso e devastador que estas drogas têm numa criança. Dá-las a uma menina pequena devia ser considerado crime, porque o é, de facto. Uma instituição que o faz não devia continuar a ter menores ao seu cuidado. Está a criar doentes que não existiam e a contribuir para a taxa de perturbados na sociedade.

A terminar, aponto outra situação: uma educadora de infância aconselhou os pais de um menino de 4 anos a darem-lhe calmantes porque ele “era hiperactivo” e, segundo a experiência dela, beneficiaria disso...

As pessoas parecem estar esquecidas que as crianças são ruidosas, brincam, saltam, fazem teatros, têm amigos invisíveis, choram, riem, são tímidas e envergonhadas hoje, atrevidas e respondonas amanhã, não gostam de colos que não conhecem, têm saudades, gostam de mimos, confundem-se e fazem partidas, são… crianças saudáveis. Se querem robots, encomendem um pela internet.