Deste livro disse o autor ser um
romance terrível que sofrera muito a escrever: “é brutal, violento e foi uma
das experiências mais dolorosas da minha vida”. Saramago descreveu-o como uma
constante aflição e tortura, onde “se mostra que não somos bons e é preciso que
tenhamos coragem para reconhecer isso.”
A obra é uma parábola onde todos
vão sendo acometidos por uma treva branca que os deixa cegos, embora, como
alguns reconheçam “cegos já éramos antes de cegar”. Todos, menos a mulher do
oftalmologista, que finge ser cega para acompanhar o marido na reclusão a que,
a princípio, votam os cegos quando ainda são minoritários na comunidade. É por
ela que nos damos conta do feroz mundo de luta humana, onde o egoísmo é uma
constante, exarcebado aqui pela ausência de restrições que - tristemente nos
damos conta - não serem uma obrigação da ética íntima de cada ser mas apenas e
só uma questão de receio de punição social que se torna inexistente dada a cegueira.
Assim, sucedem-se os casos animalescos de brutalidade, de luta pela comida, de
desprezo total pelo asseio, e, finalmente, de invasão da liberdade alheia e de
descaso pela dor de outrem como são as violações e os homicídios.
Para retirar ainda mais da
humanidade das personagens, nenhuma delas tem nome, sendo apenas referida por
uma característica acessória, e.g.: a mulher do médico, a rapariga dos óculos
escuros, o ladrão, o rapazinho estrábico.
Saramago ganhou o Nobel em 1998,
três anos depois da publicação deste romance, pela sua “imaginação, compaixão e
ironia, que continuamente nos permitem apreender uma realidade indefinível.”