Nicholas Carr foi finalista do
Pulitzer 2011 com The Shallows (Os Superficiais), um livro sobre o modo como
essa revolução chamada internet mexeu com os nossos cérebros. A teoria de Carr
é que a net nos torna menos críticos, menos atentos e concentrados, com menos
capacidade de registo na memória, levando à destruição das aptidões de
raciocínio, interpretação e processamento de informação. Em suma, menos
inteligentes. Há quem o conteste. Mas há também estudos das Universidades de
Columbia, Stanford e Harvard (citados pelo próprio) que suportam as suas ideias
de que a net nos está a fazer regredir para um pensamento mais primitivo.
Para acreditarmos em tal, temos
de ser adeptos do conceito de neuroplasticidade, isto é da ideia de que os
nossos cérebros se adaptam constantemente às circunstâncias – por oposição à
visão dogmática que nos diz que, a partir de certa idade, o cérebro já perdeu a
possibilidade de novas aprendizagens.
Não é difícil verificar que a
enorme (e louvável) disponibilidade de informação que a net apresenta faz com
que as pessoas deixem de ter de se esforçar para conseguir encontrar
conhecimento. Isso leva a que, na generalidade, haja uma preguiça cerebral que
se traduz não só neurologicamente nas ligações entre neurónios mas também a
nível cognitivo, nomeadamente em termos de profundidade. De facto, os conceitos
que adquirimos através da net são um instantâneo, não têm qualquer fundura. Metaforicamente
falando, creio bem que se pode dizer que a internet será uma espécie de fast
food enquanto o suporte físico é uma experiência gourmet - aliás, como pode a
internet ser tão apelativa quando nem sequer tem aroma, perdoem-me a divagação…
Haverá coisa mais saborosa do que cheirar? E isso também entra na esfera do
conhecimento – livros novos e velhos, experiências cheiram sempre bem, deixam
rasto.
O rasto leva-nos à volatilidade
da internet. Poder-se-ia até acrescentar que toda a vida actual prima por ser
fugaz e inconsequentemente rápida. Carr opina que a profusão de hyperlinks faz
saltar a nossa atenção de modo constante, encoraja-nos a avançar depressa sobre
toda a informação mas a pensar muito pouco sobre ela. Talvez esse seja o
problema em si. De facto, de que serve tanto input se não o absorvemos, se nem
sequer paramos um instante para a reflexão pessoal e para formar a nossa
percepção? Este défice de contemplação e de espírito científico parece-me ainda
mais grave do que a perda de concentração que está na sua origem.
Não estou certa de que a
tecnologia nos torna estúpidos. Tenho um irmão que é um wiz da informática, e,
contrariando as estatísticas, é um jovem crítico, informado e racional. Além
disso, também contra os estereótipos, não é um nerd anti-social. Mas admito que
isso acontece porque ele próprio é ferozmente analítico relativamente aos
fenómenos em rede e tem o discernimento para não se limitar à virtualidade dos
assuntos.
Nos meus dias pró-tecnologia,
acho que o meu irmão não é excepção e que o Google, a Wikipedia e o Facebook
são grandes invenções. Nos meus dias do contra, em que me surpreendo com um
aluno que frequenta uma instituição universitária a perguntar-me: “Professora,
o Antigo Testamento é um livro ou alguma cena da internet?”, fico convencida
que Carr tem razão. Há qualquer coisa de muito errado quando alguém só comunica
por meio de bytes.
E mais ainda me assusto quando
vejo um par de namorados que só namora através da net. Não haverá um handicap
relacional em alguém que só consegue expressar proximidade estando protegido
por um ecrã de permeio? Este paradoxo só vem confirmar que a sociedade virtual
é uma espécie de onanismo o que, como se sabe, é uma conduta que pode ser
normal mas não deixa de ser estéril.