... "And now for something completely different" Monty Python

Thursday, January 3, 2013

Call Girls



Há dias, fiz uma legítima pergunta no Facebook (e agradeço muito a todos os que perderam tempo a esclarecer-me, directamente ou por mensagem): sendo a prostituição ilegal em Portugal, como é que pode ser publicitada nos orgãos de comunicação social? De facto, não faltam exemplos desde a "Menina atraente, calma, simpática, muito experiente, atende em privado” às “Quentes e fogosas, vindas de longe, para satisfazer as tuas fantasias” tudo isto seguido do número de telefone xxx. Portanto, fiquei confusa sobre a ilegalidade de uma actividade cuja publicidade em órgãos públicos não é ilegal!

Algumas das respostas tinham retóricas invejáveis, mas o ponto mantinha-se: como é que era possível promover uma actividade ilegal? Não era óbvio que bastava às autoridades competentes ligarem para esses números para apanharem as ditas transgressoras? Como é que os órgãos de comunicação social podiam ganhar dinheiro com a inserção de publicidade livre de uma actividade punida por lei? Inclusivamente, o também cronista deste jornal, Paulo Mendes, sugeriu, numa excelente frase “é ilegal, mas depois criamos um quadro de aceitação colectiva para que a coisa aconteça”, o que expressa bem um certo “laissez faire, laissez passer” que em Portugal, infelizmente, não tem a ver com liberalismo económico...

Entretanto, houve quem generosamente me elucidasse sobre o verdadeiro contexto legal da actividade sexual com fins lucrativos: ao que me explicaram, desde 2001 que a prostituição não é nem deixa de ser crime em Portugal, pois que pura e simplesmente nem sequer se encontra regulamentada – é um conveniente “vazio legal” ao qual se vira a cara, fingindo que nem existe. O que é crime, punido pela lei, é o aproveitamento de terceiros desta actividade, ou seja, o crime dito de lenocínio, que se constitui pela intenção de fomentar ou facilitar o exercício de prostituição de outra pessoa (naturalmente lucrando com isso). Ou seja, na realidade, um possível “patrão” destas “meninas” é que age contra a lei, sobretudo se ficar provado que usou de ardil ou ameaça para as coagir a prostituírem-se – o que, aliás, é quase impossível provar em tribunal, mas adiante… Logo, dentro da Lei portuguesa, podem as meninas publicitar o seu negócio, desde que sejam trabalhadoras por conta própria!

Como me dei conta que havia muitas pessoas com a mesma dúvida que eu, aqui vos deixo este esclarecimento. Afinal, a Assembleia da República é mais sábia do que pensamos. Vai deixando estes buracos legais, e fica todo o país a ganhar: ganham os trabalhadores, ganham os clientes, ganham os tribunais que ficam com menos processos, ganham os jornais que recebem dinheiro pela publicidade inserida, ganha, enfim, a economia que gira. Só não percebo como é que estes trabalhadores independentes passam recibos e gostaria que, muito justamente, descontassem para a Segurança Social como eu – alguém o sugira a Vítor Gaspar, por favor. Por outro lado, podiam passar a ter direitos e deveres concretos, como inspecções relativamente às doenças sexualmente transmissíveis e protecção contra abusos. Ah, mas já me esquecia… Isso era se legalizássemos a actividade. Em bom rigor, legalmente, não se pode falar de uma actividade que não existe – a não ser que seja promovida por outrem (estão a ver como a Lei tem lógica?)

A terminar, sugiro-vos que vejam o filme português “Call Girl” de António Pedro Vasconcelos, um exemplo perfeito de como estas “meninas” são importantes na esfera política das cidades pequenas deste Portugal. No mais, estou como uma boa amiga que me respondeu no Facebook: “Há anos que tenho vontade de ligar para uma senhora cujo número vem no jornal, porque ela promete realizar todas as minhas fantasias. Vejo-a chegar a minha casa e eu dizia-lhe “Esta é a tábua de engomar, o ferro está aqui e esse montão são as roupas.” Cada um é que sabe, secretamente, do que mais precisa!