Um dos aspetos negativos da nossa atual tendência para viver com as últimas
caixas que mudaram o mundo é a dependência emotiva que criamos delas. Numa Ted
Talk intitulada “Alone Together”, fala-se de como, hoje, as relações afetivas
se vivem através da internet e do telemóvel. Sherry Turkle diz que, a primeira
vez que deu uma conferência, a sua filha estava na primeira fila. Anos depois,
a filha mandou-lhe uma mensagem de telemóvel a desejar boa sorte antes da
conferência que a mãe ia dar… Essa mensagem foi para Turkle tão importante e
real como um abraço: “Como veem, sou uma vítima dos aspetos que estudo”.
As pessoas mandam mensagens no telemóvel e no Facebook em todo o sítio,
mesmo em funerais, à mesa do pequeno –almoço e em reuniões. Há quem mande
mensagem a quem esteja sentado ao seu lado, em vez de lhe falar. Turkle, que
estuda o impacto da tecnologia nas relações humanas, diz que a maior parte das
pessoas se sente mais confortável a conversar no computador do que a dar as
mãos.
O que os seres humanos pretendem é estar ali, junto do outro, mas também estar
em todos os outros sítios onde não estão. A tecnologia permite criar a ilusão
de que se está em todo o lado ao mesmo tempo e de que não perdemos quase nada
dum mundo que queremos abarcar o mais possível.
A questão mais profunda é que o ser humano é obcecado pelo controlo. Usar os
meios tecnológicos permite acessar aos botões “edit” e “delete” para retocar ou
apagar coisas que dissemos e que correram mal. Mas nas conversações do dia a
dia o que é dito… fica dito. Hoje, as pessoas têm medo de conversar sem o
conforto da borracha tecnológica. Perdendo o hábito da conversação sem rede,
perdem-se também os perigos e alegrias que ela encerra. Nomeadamente, o perigo
de ter uma relação humana completa, ainda que com asneiras pelo meio.
A substituição da conversa frente a frente pela conversa tecnológica é tão
comum que a generalidade dos adolescentes já tem dificuldade em conversar. Não
o aprenderam e têm medo de se encontrar sem antes iniciarem contacto pelas
redes sociais. A consequência psicológica disto é muito grave: implica solidão
e uma falsa ideia de que o conhecimento de alguém faz-se com uma proteção de
permeio.
A comunicação tecnológica obteve tanto sucesso porque o sentimento de que
ninguém nos ouve é colmatado por redes sociais criando uma ilusão de ouvintes
enquanto que também protegem de desilusões profundas. De fato, a tecnologia é
tão poderosa que já existem os chamados “robots sociais” para acompanhar velhos
e crianças, exatamente as camadas da população que estão mais sós.
A tecnologia apanhou-nos pelo lado mais vulnerável: estamos sozinhos mas
temos medo da intimidade. É por isso que nos viramos para o ecrã, com as suas
ilusões de intimidade e de controlo. Perdemos, portanto, a confiança de que os
seres humanos estarão lá uns para os outros… mas a máquina amiga vai sempre lá
estar, e com menos exigências.
A ideia de que nunca estaremos sozinhos com tecnologia é tão real que os
solitários nas mesas e filas agarram-se logo aos telemóveis; têm pânico de
serem vistos desconectados.
E, assim, como já ninguém sabe estar sozinho também já não se sabe estar
acompanhado na vida real. Conversar com alguém ou refletir é complicado e é
arriscado… mas bem mais compensador do que nunca se conhecer por dentro e do que
romances e amigos num plano virtual.