... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, August 2, 2013

As solitárias moderninhas

Tenho uma colega já de certa idade que não tem família, e, portanto, passa as férias a viajar por onde lhe apetece. Por mais livre que a sua vida pareça, ouço sempre comentários  sobre a “solteirona” e isso levou-me a pensar: porque é que, numa sociedade que se diz igualitária, os homens celibatários são sempre tidos como interessantes e até “bons partidos” enquanto que as mulheres são vistas como frias e desesperadas? Pela mesma razão que os cabelos brancos dos homens dão charme e os das mulheres mostram a idade. A nossa cultura deu à menopausa um enorme peso, e tornou muito dura a passagem desse período para alguém que não chegou a ter filhos. Aliás, em inglês o termo “spinster” (solteirona) é reservado apenas para quem nunca casou nem teve descendência e traduz uma falsa ideia antiquada de virgindade preservada e de rigidez, tanto física como de ideais. O termo “bachelor” (solteirão) não tem qualquer conotação pejorativa e, embora designe quem nunca deu o nó, nada tem a ver com filhos – porque os homens não sabem ao certo quantos filhos têm (?)

Estou longe dessa realidade, mas há outras das quais posso falar com maior conhecimento. Por exemplo, ainda hoje, uma mãe sozinha é vista como alguém com um comportamento irregular. Aqueles que já estão a torcer o nariz, experimentem arranjar emprego, alugar casa, pedir empréstimos e qualquer questão legal ou burocrática comum. Quem não tem companheiro é, em primeiro lugar, vista como alguém desesperada por tempo, por dinheiro e por apoio porque “coitadinha, tem uma família sozinha” e, em segundo lugar, promíscua pois o suposto desespero mencionado aliado ao facto de se ter separado voluntariamente (no caso de não ter enviuvado) dá a ideia de que “atenção, está à procura de alguém”. Raros são aqueles a quem ocorre que uma mulher racional é perfeitamente capaz de organizar a sua vida, a curto e a longo prazo, da mesma forma que um homem (ou melhor, se não tiver de tratar de um homem dependente ou se tiver de suportar um violento). Para além disso, se já era ela que tratava da família antes de se separar, qual a diferença, excepto o facto de que agora tem menos trabalho e preocupações? E porque havia ela de estar à procura de um marido se abdicou dessa realidade?

Claro que estes exemplos se reportam a mulheres inteligentes. Concordo que não há muitas – nem há muitos homens inteligentes, embora de um e de outro existam imitações, que estão para os casos reais como o jogo electrónico d’Os Sims está para a vida…

Também admito que é mais difícil para as inteligentes terem companheiros. A nossa sociedade coloca o homem na eterna posição de professor e a mulher na de aprendiz, pelo que é necessário um homem muito seguro de si para perceber que esses papéis inflexíveis são absolutamente  irrealistas e que, por conseguinte, onde há duas cabeças pensantes há sempre dois professores e dois aprendizes que se vão revezando consoante os momentos. Porém, quando uma cabeça insegura se sente ultrapassada só tem uma forma de se fazer obedecer: submeter pelo domínio, seja manipulativo e astuto, seja por meio da força bruta. Essas tentativas de submissão são válidas tanto para homens como para mulheres – pois também há mulheres imensamente dominadoras,  que se escudam numa capa “soft” de eterno feminino para melhor dominar.


Voltando ao início: a mulher conseguiu, seguramente, muitas coisas na nossa sociedade. Mas, do ponto de vista cultural, ainda é olhada de lado se decide não ter par. Já o homem, par ou ímpar, continua a manter bom status. Ainda consideramos que a mulher jamais pode ser alguém sem um homem porque o papel primordial da mulher é “ser mulher de alguém” e o do homem é ser ele próprio.