Nunca tinha ouvido falar de
Cipolla, até que um amigo achou que era tempo de eu conhecer uma obra
denominada “The Basic Laws of Human Stupidity”. É um livrinho pragmático e
sarcástico, tanto mais curto quanto recorre a gráficos para demonstrar o que
expressa.
Passando por cima dos gráficos – complicados
de explicar numa crónica, mas garantidamente farão a delícia dos espíritos
matemáticos para que a lógica resulte – examinemos as tais leis básicas.
Segundo Cipolla, a primeira e incontornável Lei é que “Sempre e
inevitavelmente, todos subestimamos a quantidade de indivíduos estúpidos em
circulação.” Não é que o número seja infinito, já que finito é o número de
indivíduos no mundo – já se disse que o livro é matemático q.b. – mas não se
pode determinar sequer já que faz parte da natureza humana julgar os outros de
forma mais valorativa do que a generalidade merece e ainda porque a vida diária
demonstra continuamente que a estupidez boicota as acções rotineiras. A segunda
Lei mexe mais com as convicções humanas, já que, como bem diz o próprio autor,
a moda do mundo ocidental industrializado advoga que todos nascem iguais e com
as mesmas capacidades, sendo que se uns alcançam umas coisas e outros não, isso
se deve apenas à falta de oportunidade ou à educação. Errado. Tal como uns
nascem ruivos e outros morenos, também uns nascerão inteligentes e outros
inevitavelmente estúpidos (os segundos em larga maioria). Além disso, “a
estupidez é completamente independente das restantes características do
indivíduo”, de onde se conclui que grassa em igual número por todas as etnias,
sexos e classes sociais. A estupidez é democrática, mas não arrivista – aliás,
de tão comum, ela é a vulgaridade por excelência.
O autor define um estúpido como
sendo aquele que “causa perdas ou problemas a terceiros, sem que ele mesmo
retire disso qualquer ganho, pelo contrário; o próprio autor das acções pode
mesmo incorrer em perdas.” Para melhor compreensão, leiam a divisão humana em
desamparados, ingénuos, inteligentes, bandidos e estúpidos. As linhas não são
completamente estanques, e.g. um bandido pode ser “um bocado estúpido” (nunca é
inteligente, ao contrário do que pensa e pensa-o sempre!). É muito curioso e
extremamente divertido verificar os gráficos em que o autor analisa a
frequência distributiva destes indivíduos, com exemplos.
Finalmente, há dois capítulos
inultrapassáveis: “Stupidty and Power” e “The Power of Stupidity”. No primeiro,
aborda-se o incontornável facto de haver imensos indivíduos em cargos de
destaque que são declaradamente estúpidos porque as suas acções se convertem em
danos para o resto do mundo, nem sequer beneficiando os próprios por aí além.
Isto é tanto mais grave quanto a sua posição alarga o espectro de gravidade dos
danos que fazem.
No outro capítulo, explica-se que
o poder da estupidez está na sua irracionalidade. O inteligente, racional por
excelência, confunde-se perante as acções estúpidas, perde o pé, vacila e chega
a duvidar que tanta tolice esteja em marcha. É esta sua falta de reacção
perante o irracional e o ilógico que mais faz avançar o poder galopante do estúpido.
As últimas Leis expressam que “é
frequente subestimar o poder dos estúpidos, o que é sempre um erro muito caro,
pois eles são os mais perigosos de uma sociedade”. Assim, numa sociedade em que
proliferam bandidos e estúpidos (ou versões mescladas), começa a notar-se, em
proporção, um aumento do número de desamparados – logicamente, do lado da
barricada dos que não ocupam poder algum. Assim, estatisticamente, o poder
destrutivo da estupidez ganha terreno, a sociedade entra em declínio e, segundo
Cipolla, “o país cai no Inferno.”
Não percebo nada de matemática,
mas o livro é um mimo.