Tem-me sido perguntado porque falo de tantos assuntos
que, eventualmente (ou na opinião de alguns) não dizem directamente respeito
aos Açores. É um ponto de vista. No entanto, acredito que os Açores, ainda que
insulares, não precisam de estar insulados. Nesse sentido, penso que os casos,
as informações, as questões de âmbito mundial pertencem igualmente aos Açores e
interessam a quem lá vive. Se não é assim, teríamos de admitir que os Açores
vivem de si, em si e para si apenas – o
que seria desastroso, a começar pelo ponto de vista económico e a acabar no
cultural.
Outra questão que já me foi colocada é como traduzo as
peças jornalísticas originais de que falo para as comentar depois. É uma
pergunta um bocado escolar, mas julgo perceber nela um sentido mais profundo de
tentativa de fidelidade ao original. Terei de responder com alguma teorização
sobre o fenómeno da tradução em si.
Um trabalho de tradução literária ou técnica é sempre
um trabalho ingrato porque o tradutor se encontra num duplo papel: primeiro, o
de leitor da obra – posição equivalente à de todos os que se interessam pela
leitura da mesma - ; segundo, o de intérprete da mesma, versando-a noutra língua
e, logo, noutra cultura.
Nas traduções acontece exactamente o mesmo que com a
interpretação de uma partitura musical: embora o que lá esteja escrito seja o
mesmo para todos, cada qual a vai interpretar a seu modo. Como tal, surgem
pequenas diferenças de andamento, de expressão, umas mais subtis e outras nem
tanto. Deste modo, resulta que o que para uns é uma tradução excelente não
agradará a outros, sem desprimor de pormenores técnico-linguísticos. Por
exemplo, no caso de uma tradução literária, o que mais seduz não é a
conveniência da semântica ou o rigor da gramática; é sim o estilo, a
composição, tudo aquilo enfim que dá ao tradutor a ilusão de ser um segundo
escritor da obra em causa.
As próprias diferenças culturais que cada língua
encerra dentro do binómio significado-significante seriam suficientes para que
essa ilusão se alimentasse. É, sem dúvida, por isso que é mais aliciante (e
mais difícil) traduzir peças de línguas conjunturalmente muito diferentes da
nossa. É também por isso que, quanto mais diversa a estrutura linguística – à
qual corresponde um mundo subjacente – mais “erros” contem a tradução. Ou, como
dizem os italianos: “Traduttore, traditore”, adágio célebre para explicar que o
tradutor é um traidor... mesmo que não queira!
As crónicas de opinião são para os jornais o que as
short-stories são para a literatura, mutatis mutandis. São géneros de eleição
da contemporaneidade. Não há tempo para romances, não há alma para poesia, e as pessoas precisam de narrativas que as
preencham sem lhes roubar minutos em descrições, querem algo intenso e
evolutivo mas tudo no contra-relógio do coelho de Alice.
No entanto, as crónicas cansam porque hoje todos são
cronistas quanto mais não seja em blogs.
E é por isso que tento fazer crónicas um pouco além da minha rua, que explorem
o nosso interior sem nos roubar tempo para ele.