... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, November 7, 2014

Em jeito de resposta

Tem-me sido perguntado porque falo de tantos assuntos que, eventualmente (ou na opinião de alguns) não dizem directamente respeito aos Açores. É um ponto de vista. No entanto, acredito que os Açores, ainda que insulares, não precisam de estar insulados. Nesse sentido, penso que os casos, as informações, as questões de âmbito mundial pertencem igualmente aos Açores e interessam a quem lá vive. Se não é assim, teríamos de admitir que os Açores vivem de si, em si e para si  apenas – o que seria desastroso, a começar pelo ponto de vista económico e a acabar no cultural.

Outra questão que já me foi colocada é como traduzo as peças jornalísticas originais de que falo para as comentar depois. É uma pergunta um bocado escolar, mas julgo perceber nela um sentido mais profundo de tentativa de fidelidade ao original. Terei de responder com alguma teorização sobre o fenómeno da tradução em si.

Um trabalho de tradução literária ou técnica é sempre um trabalho ingrato porque o tradutor se encontra num duplo papel: primeiro, o de leitor da obra – posição equivalente à de todos os que se interessam pela leitura da mesma - ; segundo, o de intérprete da mesma, versando-a noutra língua e, logo, noutra cultura.

Nas traduções acontece exactamente o mesmo que com a interpretação de uma partitura musical: embora o que lá esteja escrito seja o mesmo para todos, cada qual a vai interpretar a seu modo. Como tal, surgem pequenas diferenças de andamento, de expressão, umas mais subtis e outras nem tanto. Deste modo, resulta que o que para uns é uma tradução excelente não agradará a outros, sem desprimor de pormenores técnico-linguísticos. Por exemplo, no caso de uma tradução literária, o que mais seduz não é a conveniência da semântica ou o rigor da gramática; é sim o estilo, a composição, tudo aquilo enfim que dá ao tradutor a ilusão de ser um segundo escritor da obra em causa.

As próprias diferenças culturais que cada língua encerra dentro do binómio significado-significante seriam suficientes para que essa ilusão se alimentasse. É, sem dúvida, por isso que é mais aliciante (e mais difícil) traduzir peças de línguas conjunturalmente muito diferentes da nossa. É também por isso que, quanto mais diversa a estrutura linguística – à qual corresponde um mundo subjacente – mais “erros” contem a tradução. Ou, como dizem os italianos: “Traduttore, traditore”, adágio célebre para explicar que o tradutor é um traidor... mesmo que não queira!

As crónicas de opinião são para os jornais o que as short-stories são para a literatura, mutatis mutandis. São géneros de eleição da contemporaneidade. Não há tempo para romances, não há alma para poesia,  e as pessoas precisam de narrativas que as preencham sem lhes roubar minutos em descrições, querem algo intenso e evolutivo mas tudo no contra-relógio do coelho de Alice.

No entanto, as crónicas cansam porque hoje todos são cronistas quanto mais não seja em blogs. E é por isso que tento fazer crónicas um pouco além da minha rua, que explorem o nosso interior sem nos roubar tempo para ele.