Segunda-feira,
um homem armado invadiu um café no centro de Sydney e fez reféns dos ocupantes
durante 16 horas. Tudo acabou com a
morte do dito homem e também com as mortes de dois dos reféns.
O suposto
“terrorista em nome individual” chamava-se Man Haron Monis, tinha 50 anos, e
era islâmico, tendo, inclusive, uma posição clerical no Islão. De facto, Haron
Monis obrigou alguns dos reféns a segurar uma bandeira de simbologia islâmica à
janela do café. A partir deste momento, todos os islâmicos que vivem em Sydney
começaram a recear generalizações e retaliações. Para complicar o assunto,
Haron Monis não era um imigrante qualquer. Era um iraniano que procurou asilo
politico na Austrália e cujo estatuto de refugiado politico lhe foi concedido
por alegada perseguição do regime iraniano às suas (também alegadas) convicções
liberais. Outra razão para que os imigrantes islâmicos começassem a ver esta
história com outro contorno.
Não levou muito
tempo até que o Primeiro Ministro Tony Abbott fosse interrogado pelos
jornalistas quanto a esta tragédia e claro que lhe perguntaram exactamente como
era possível que um refugiado politico, um estrangeiro protegido pelo país, se
revoltasse em actos terroristas contra esse mesmo país. Qualquer PM encurralado
teria respondido o mesmo à nação: que a Austrália talvez tenha de rever a sua
política de imigração pois talvez esteja a ser demasiado tolerante.
O fim da frase
foi como música festiva para todos os radicais e como um requiem para os
islâmicos residentes em Sydney que pensaram, justamente, que terça-feira ia ser
o primeiro de muitos dias de inferno que os esperavam na sua cidade.
Vivemos num
mundo de redes sociais. Por isso, Michael James, reporter em Sydney, fez tweet
de um episódio que se passou no metro: devido ao recente ódio inflamado contra
os islâmicos, uma mulher islâmica com receio de ser atacada tirou o seu hijab
para se tornar menos reconhecível. Enquanto o tirava, chorava. Então, uma
rapariga não-islâmica levantou-se para ir atrás dela e disse-lhe “Põe-no outra
vez. Eu vou contigo.”
Esta história
simples entre duas estranhas gerou um enorme movimento que se chama “I’ll ride
with you” (Eu vou contigo). O movimento começou no Twitter quando outra jovem,
Tessa Klum, decidiu que esta era exactamente a opção a tomar e escreveu: “Se
receias pela tua segurança nos transportes públicos porque usas símbolos
islâmicos, eu posso ir contigo. Vamos combinar horário. Melhor, vamos fazer um
movimento. Alguém se quer juntar a I’ll ride with you?” E sim, em 12 horas
milhares de pessoas se juntaram.
Milhares de pessoas não-islâmicas se voluntariaram para acompanhar
islâmicos, combinando horários ou simplesmente aparecendo nos transportes públicos
com uma pulseira, um saco, um banner identificativo que diz “I’ll ride with
you.”
O que isto quer
dizer não é apenas que na Austrália há muitas pessoas que sabem distinguir
entre o que é um homem louco – e já conhecido dos tribunais, por diversas acusações
de violência, de perseguição e de crimes sexuais – e o que é um grupo de
pessoas que não o reconhece como seu representante nem se identifica nas suas
acções desumanas. Isto quer também dizer que a resposta de um país a um acto de
violência feito por um imigrante só pode ser esta. Por duas razões: primeiro,
porque a resposta de um país a actos de violência feitos por um seu cidadão
nunca é ostracizar a nação toda (e reparem que a lógica seria igual) e segundo
porque este movimento desencoraja completamente qualquer atitude dos grupos
extremistas.
Sydney disse-nos
esta semana que o sistema falhou, não porque acolheu um refugiado mas porque
deixou um criminoso como Monis fora da cadeia. Mas duas raparigas anónimas
criaram um movimento. Estas raparigas são a vida da cidade. E talvez venham, um
dia destes, a fazer parte do grupo que decide.