Se há alguma doença geracional
que afete os chamados “millenials” (os nascidos entre o início dos anos 80 e
agora) essa doença é o tédio. Aqueles que convivem com jovens adultos
quotidianamente sentem essa realidade em peso. A mais frequente expressão
emocional dos jovens deixou de ser a rebeldia, o inconformismo, a luta
geracional ou – noutro lado da balança – a paixão, a coragem e o ardor próprios
da juventude. Nada disso. A emoção mais usualmente expressa é o tédio. Estão
cansados e não sabem bem de quê. Não se interessam muito por nada em especial,
porque “nada vale a pena”, tudo é efémero e capaz de produzir desapontamento em
grande escala. Interessam-se menos ainda pelos seus pares, porque, se acreditam
nalguma coisa, é que não se pode confiar em ninguém. Poder-se-ia chamar a esta
uma geração de cínicos, mas na realidade não o são. São apenas tão desiludidos
de tudo (mesmo do que não experimentaram) que não acreditam que nada vá fazer
diferença. É como se estivessem automaticamente fadados a um destino de infinda
monotonia. E lá vão, passando os dias, arrastando-se de aulas para trabalhos e
de discotecas para casas, com o mesmo ar aborrecido de sempre – uma espécie de
supremo desprezo por tudo e, ao mesmo tempo, de auto comiseração. Queriam fazer
e ser diferente, mas para quê? Não há resultado que valha a energia. A apatia é
o estado geral de uma geração que, paradoxalmente, tem tanto para dar ao mundo.
Poder-se-á argumentar que
existiram outros períodos assim na História recente. Imediatamente nos vem à
ideia o “spleen” romântico, por exemplo. Mas os Românticos tinham crenças e, se
exageravam no “spleen” a verdade é que também carregavam noutros sentimentos,
nomeadamente em conceções amorosas – ainda que mitificadas. A questão dos
“millenials” é que não sentem lá muito por nada em particular.
George Steiner disse que o tédio
é um dos grandes perigos de qualquer civilização e o despoletar de muitas
guerras. A passividade física e a lassidão intelectual seriam o resultado de uma
facilidade do mundo-toca-num-botão aliada à desesperança de sair das misérias
atuais (sejam estas de que natureza forem).
A primeira geração de
“millenials” que teve a sua adolescência no fim dos anos 90 era um pouco
diferente – basta ouvir a música da época e recordar o conceito do “grunge”
para observar que sim, havia um sentimento de “mundo horrível” mas a par de uma
grande revolta (nomeadamente uma revolta de cariz familiar contra o deixa-andar
dos seus pais neo-hippies). Dessa primeira geração – na qual me incluo – saiu o
núcleo Eddie Vedder e o núcleo Kurt Cobain, isto é, uma onda de evolução que
racionalmente acabou numa revolta mais mística e outra onda que não consegue
aguentar com o peso do mundo e desiste. Foi esta última que parece ter sobrevivido
para contar a história destes “millenials” atuais, tão descomprometidos com o
mundo como com o seu próprio sentir. Já não se pode falar apenas do erro de
Descartes, mas também e infelizmente no de Damásio, porque nem as emoções são
capazes de ter força motriz.
Em 2013, Goetz e a sua equipa de
investigadores chegaram à conclusão que havia um novo tipo de “boredom” na
juventude atual, um nível de aborrecimento intrínseco, apático de nascença. Um
nível de tédio tão forte que ultrapassava o “ennui”, não acordava com qualquer
tipo de estímulo e só era comparável à palavra desamparo. 36% dos jovens
inquiridos não sofria de depressão; eram deprimidos, desta forma incapaz de
remissão.
Para nós, a “effed up generation”
(como chamou Vedder à senda sobrevivente dos anos 90), a apatia é difícil de
digerir. E é por isso que é tão triste ouvir jovens de 19 anos falar da vida
como se ela fosse um intervalo bocejante entre nascer e morrer em efetivo. Sou
suspeita, mas preferia a revolta do grito contra o mundo do que este sussurrar
agastado. Uma geração deve querer mudar o mundo. Preocupa-me um nihilismo que
nem tem força anímica para chorar.