O Verão passado, uma amiga minha respondeu ao anúncio de uma banda que
procurava vocalistas. Não foi aceite, porque “a banda só aceitava homens”. Eu
entendia isto perfeitamente se a banda quisesse uma voz masculina. Podia ser
que preferissem uma voz mais grave (sobretudo se fossem uma banda de doom ou de
trash metal, o que até nem era o caso). Mas não era essa a razão. Acontece que
numa banda de rock alternativo constituída apenas por rapazes, eles achavam
“estranho” (sic) ter ali uma rapariga. A minha amiga fez um vídeo com excertos
de estilos vários, com bandas onde há uma miúda - Smashing Pumpkins, Fleetwood Mac, No Doubt,
Evanescence, Nightwish, Garbage, Cranberries, Jefferson Airplane… - e depois
mandou-lhos, com uma notinha a dizer (traduzo): “Incomoda-vos o facto de eu não
ter um pénis ou incomoda-vos a hipótese de não conseguirem controlar os vossos
comigo por perto?”
Quando as pessoas me dizem que já não há discriminação de género hoje em
dia e que as mulheres imaginam (porque “imaginar” é o verbo que usam para falar
destas coisas) que a discriminação baseada no sexo existe, gosto de lhes dar
exemplos práticos. Uma banda formada por homens entre os vinte e os vinte e
sete anos. Músicos, gente supostamente virada para o futuro. Acham “estranho”
ensaiar e tocar com uma mulher. Um deles até confessou que ele, pessoalmente,
não se incomodava mas que a namorada dele ia importar-se. Tradução: sou um tipo
emancipado e progressista mas namoro uma mulher altamente ciumenta que odeia as
outras mulheres todas e deixei o meu progresso e a minha virilidade fechados dentro
da mala dela.
Eu podia dissertar imenso sobre a velha frase “o pior inimigo de uma mulher
é sempre outra mulher menos dotada do que ela” mas é sempre uma frase que me
entristece… pela verdade que contem.
É por estas coisas que fiquei muito contente por ter um filho e não uma
filha. Em princípio e generalizando, a vida será, para ele, mais fácil porque
nasceu homem. Eventualmente, nalguns aspetos – guardo-os para uma próxima
crónica – nascer homem é uma complicação (da qual não estarei tão apta a
falar). No entanto, se o meu rebento tivesse nascido mulher, seria
convictamente mais complicado o seu percurso.
Espero, sobretudo, que um dia, ele seja um homem a sério. Um homem que
tenha orgulho em si e nas suas escolhas. Se ele tocar numa banda, que toque com
quem quiser, sem se preocupar com a opinião dos amigos e da namorada e da mãe (pode
dar-me esta crónica, no caso de eu me ter esquecido até lá). Que não tenha
ideias que perigosamente arrumam as pessoas em categorias rotuladas nem
sentimentos de posse tão grandes e graves que impeçam as pessoas de quem ele
mais gosta de serem livres para viverem, porque – já diziam os Antigos Gregos –
o Amor é Vida, nunca o seu contrário.
Porque, afinal, a única forma de estarmos todos melhor é evitarmos o que
nos encerra e o que nos enterra, como nos ensinou Savater.