... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, October 23, 2015

Almoço, uma instituição "tuga"


Em Portugal, o almoço é uma instituição. Experimentem ir trabalhar para outros países e vão ver como tenho razão. Aqui, todo aquele que se contentar em almoçar uma sandes ou – pior ainda – todo aquele que se contentar em almoçar uma sandes na companhia apenas de si mesmo é imediatamente olhado de lado pelos colegas. É um anti-social e um anorético. Aquilo que na Holanda (por exemplo) seria um comportamento regular, em Portugal é um caso de psiquiatria. Por cá, o almoço é um momento (con)sagrado, e entre o meio-dia e as três não há quem escape a uma fartura de comida que na Etiópia daria para alimentar várias famílias.

O português, nomeadamente o empregado de mesa, fala dos alimentos com insuspeitada ternura. É “um arrozinho”, “um peixinho”, “hoje temos franguinho”, “não quer uma saladinha de frutas?” Mas não se pense que o uso de diminutivos é compatível com o tamanho das doses. De facto, ao encomendar um arrozinho de frango, pensaria qualquer estrangeiro que ia receber um pratinho nouvelle cuisine com duas colherzinhas de arroz e uns fiozinhos de frango por cima. Desengane-se. O português não faz a coisa por menos de uma travessa, onde vem metade de uma ave de capoeira e uma pratada com meio quilo de arroz.

Antes disso, já se comeu uma “sopinha”. Ao contrário da maioria das nacionalidades, o português não come sopa como sendo uma refeição. Não, senhor. O português apenas inicia a refeição com sopa (antes, aliás, já comeu umas entraditas, sendo estas uns queijos, pão com manteiga, azeitonas e rodelas de enchidos - para abrir o apetite). A sopa constitui uma forma de aquecer o estômago. Depois, é que vem o prato propriamente dito que é o quando o português considera que começou, finalmente!, a comer.

Quando chega o prato principal, o português assegura-se que ele tenha vários acompanhamentos. Raro é que o bifinho venha apenas com arroz. De facto, o português ofende-se se um bife não vier acompanhado de arroz, batatas fritas, salada e ainda com um ovo a cavalo! Para além disso, há que comer aquele molho e, para tal, o português tem sempre de acompanhar o prato com muito pãozinho.
No fim, há que “desenjoar” – delicioso verbo que pressupõe, de imediato, que a comida não estava lá grande coisa. Assim, há que terminar em beleza com uma coisinha doce.

No decurso da refeição, por imperiosa necessidade de empurrar a comida, teve de se beber alguma coisa. Necessariamente, vinho.

Entretanto, já uma pessoa está cheia até à gola, e há que tomar um café, não raro acompanhado de um digestivo – outra deliciosa expressão, já que o álcool, em si, nunca ajudou o estômago a digerir coisa alguma.


Se acham que exagero, haviam de ter visto a expressão da minha amiga norueguesa quando, recentemente, a levámos a almoçar. Depois das entradas de rissóis e pastéis e carnes frias e do vinho português, ela agradeceu muito, tinha adorado. Foi aí que explicámos que era só o começo. A pobre ia tendo um colapso quando viu trazerem um cabrito para a mesa.