O Natal é prova de que a igualdade de género ainda não
chegou às casas portuguesas. No Natal, enquanto os homens estão sentados a
comer, a ver televisão, a conversar, a beber e a descansar de terem comido e
bebido, as mulheres estão a preparar comida e a limpar, a embalar presentes, a
decorar, e a preparar mais comida. No meio de tudo isto, não percebo porque é
que há tantos homens que dizem que não gostam do Natal. Parece-me a mais
completa expressão – se não talvez a expressão remanescente – do Homos
Lusitanus primitivo.
Há os que procuram fazer a festa. A quantidade de
porcaria nas paredes da cozinha faz pensar que o pobre perú foi abatido ali e
não num matadouro. Felizmente, os congelados afastam essa ideia. Outra questão
higiénica muito comum é a lavagem dos vegetais e leguminosas – os homens não
lavam nada; “assim, até se sente mais o sabor!” Prazos de validade de molhos
pré-feitos, mostardas e outros que tais são amplamente ignorados. No arriscar é
que está o ganho. Finalmente, e para não perder tempo com “mariquices”, levam
para a mesa tudo nos recipientes em que foi cozinhado. Não há cá travessas
“para ficar bonito”. A justificação é a de que assim há menos louça para lavar.
Aquele que pedir “um bocadinho de sal” pode apostar que vai levar com um pacote
de sal (grosso, naturalmente) em cima da mesa.
Apesar da ironia anterior, estes homens têm a minha
mais profunda vénia. Exceto no que diz respeito à parte da limpeza posterior…
pois se é verdade que encontramos muitos homens que apreciam cozinhar, não
conheço nenhum que limpe a cozinha a seguir. Tornam-se logo ursos peludos e
desajeitados que partem os pratos todos em que tocam por absoluta falta de
jeito (dizem eles… mas na verdade, chama-se falta de vontade; é a mesma falta
de vontade que os ataca quando lhes pedem para alimentar um bebé de 3 meses e
eles replicam “Pode ser uma fatia de pizza?”) É também por falta de vontade,
i.e. para não se chatearem, que as mulheres decidem ir logo limpar a dita
cozinha. Caso contrário, deixavam a parede e os pratos sujos criar crosta até
serem limpos. Aliás, se repararem, as cozinhas e as casas dos homens que vivem
sozinhos são sítios absolutamente impecáveis e limpos. De forma que não,
senhoras, eles não sofrem de nenhuma inépcia genética que os impeça de passar
uma esfregona nos azulejos.
O que me desgosta é que, nas casas portuguesas, as
mães geralmente educam as meninas a servirem os meninos, seus irmãos. É no
Natal que esta diferença educativa salta à vista. Estão as meninas muito
afadigadas, limpando, carregando e os manos à espera, sentados como lordes. Mas
espera-se que depois, na juventude e na idade adulta, o mundo prime pela
igualdade!
Há uma citação, alegadamente de
Aristóteles, que diz “Dêem-me uma criança até à idade de sete anos e eu
mostrar-vos-ei o homem”, que demonstra bem o valor da educação e dos exemplos
nos tenros anos. Por isto mesmo, o meu desejo é que as mães (quer se queira
quer não, as maiores educadoras dos filhos) promovam o respeito e a igualdade
desde sempre, com naturalidade… E não como se fosse um acontecimento que
aparece quando se cresce, assim como as borbulhas.