Na quinzena,
duas notícias foram manchete nos E.U.A. O massacre da discoteca em Orlando e o
fim(?) do julgamento de Brock Turner. Ambas são paradigmáticas de uma visão
atual preocupante.
É pouco
relevante que se discuta se o atirador de Orlando, Omar Mateen, era muçulmano
ou tinha conexões ao Estado Islâmico. Importante é perceber porque é que um
homem, qualquer homem, chega a uma loja nos EUA e compra uma AR-15 (a arma com
que Mateen disparou). Não é uma arma de desporto, não é uma arma de caça, não é
uma arma de defesa pessoal. É o nome que se dá ao modelo civil correspondente
às M16 militares e em tudo similares a estas. Portanto, um tipo entra numa
loja, identifica-se, compra uma espingarda semi-automática e sai. No problem. Ninguém
quer saber se ele vai matar coelhos ou seres humanos. As questões que hoje se
colocam em relação à sua persona – violento, misógino, homofóbico, com um
historial de abuso doméstico e possível uso de medicamentos – são questões que
se deviam colocar quando alguém quer comprar uma arma... e não depois desse
alguém matar 50 pessoas. O retrato psicológico de um indivíduo tem alguma
utilidade depois do crime mas apenas para ajudar a prevenir crimes
posteriores... nunca, jamais, terá utilidade para o crime que já se passou!
Massacres nos
EUA não são novidade. É por isso que é com algum sarcasmo que reajo a imagens
moralistas que nos mostram miúdos do Terceiro Mundo de arma na mão, e dizem que
temos de acabar com essa desgraça. Até parece que no Primeiro Mundo (expressão
engraçada!) não existe o mesmo... só que com mais dinheiro e noutro
enquadramento.
Ficarei admirada
se o massacre de Orlando vier mudar as leis de posse de armas nos EUA. O
massacre de Sandy Hook em que morreram vinte crianças de 7 anos não mudou coisa
alguma em 2012... Porque é que este mudaria? Mas talvez mude pois as crianças
não votam!
Já a sentença
judicial de Brock Turner no caso Estado da Califórnia vs. Turner (e não
rapariga violada em plena universidade vs Turner, como alguns pensam, já que é
um crime público andar a violar gente) seria humorística se não fosse
lamentável.
Turner,
estudante exemplar em Stanford e atleta de renome, promessa em treino para um
possível lugar na equipa Olímpica, foi apanhado por dois outros alunos a violar
uma colega que se encontrava inconsciente nos jardins da Universidade de
Stanford. Como a rapariga só recuperou a consciência no hospital várias horas
depois, nada do que ela diz é considerado prova. De facto, Turner até podia ter
violado uma morta. Não estava acordada, logo o juiz não a considera
factual. O DNA de Turner não está na
vítima (porque ele a penetrou com os dedos e com objetos segundo as testemunhas
e as provas médicas), mas o da vítima está em Turner. O juiz considera isto uma
violação menor. Ficai a saber que há graus de violação e que, assim como assim,
estando ela inconsciente, um objecto ou outro, um dedo a mais ou a menos, uma
ferida ou outra, tanto faz. Turner mostrou “simpatizar com a vítima” (diz a
sentença) e “perceber que o álcool prejudica”. Porque Turner foi apanhado em
plena “acção” (“acção” é o que está lá escrito, porque um gajo não viola; age)
seria difícil não o condenar e o juíz deu-lhe seis meses de prisão, que diminui
para três por boa conduta. Seguiram-se várias cartas e petições porque Turner é
tão bom rapaz e tão bom atleta que há quem ache que 3 meses é muito tempo para
um tipo pagar por ter sido apanhado a penetrar uma rapariga em estado comatoso.
Eu só queria
saber quantos segundos o Brock faz nas suas piscinas olímpicas. Porque esses
segundos, senhores, é quanto vos basta ser para poderem fazer toda a porcaria
extra-aquática que vocês quiserem.