A única coisa que me entristece
no início de um novo ano letivo é saber que começou mais uma competição. Cada
ano, este espírito se intensifica. Os alunos da Universidade competem entre
eles, mesmo que digam que não. Por seu lado, os docentes, árbitros no jogo dos
alunos, também competem! Chegados ao fim do ano, se estamos no top dos
professores, muito bem. Se não estamos no pódio, é como nos Jogos Olímpicos: de
pouco nos serviu participar.
No entanto, o que mais me
preocupa como ser humano não é esta competição de gente adulta. É a competição
que se instila nos miúdos desde o primeiro dia da sua vida (pré)escolar.
De forma generalizada, ser “o
melhor da sua aula” é a ambição incutida em toda a criança por pais e professores.
Saudável e desejável se estivermos a falar da ampliação de conhecimentos.
Porém, o mais comum é estarmos a falar tão somente da obtenção de uma nota. Há
crianças portuguesas que fazem festa de graduação da Pré – parece piada, mas
não… A Pré é levada a sério. Como se não tivessem muitos anos para serem sérios
sem terem de começar já aos 5, de beca fingida e capelo.
Os exames nacionais começam no 2º
ano de escolaridade. Há crianças que passam verdadeiros tormentos por causa
disto, não tanto pelo que significa (todos nós fizemos exames e sobrevivemos)
mas pela pressão que os pais lhes incutem – “Vê lá não fiques atrás do João!”
“Não apanhes pior nota que a Maria!” De facto, há pais que, como treinadores
desportivos nunca iam fazer fortuna, tal é a ansiedade que vertem. São os mesmos
que stressam imenso com os trabalhos de casa e os de férias - não há maior
contra senso do que a frase “trabalhos de férias”, aliás. Levantaria burburinho de sindicato caso a
criança fosse um trabalhador, mas toda a mãe e todo o professor sabem do que falo.
A criança trabalha mais do que um adulto, se formos a pensar corretamente.
Deveria dormir bastante mais do que um adulto e ter mais horas de lazer porque,
literalmente, aprende com a experiência da brincadeira. Mas a Educação está
cheia de “metas” e corremos tanto para lá chegar, carregados de livros – em
cada ano que passa, é maior o peso destes e mais a soma do dinheiro que se
gasta neles. Livros são sabedoria mas quando saboreados com intenção, entendidos…
Haverá tempo para tal quando os consumimos como pastilhas?
Nesta confusão, os alunos, como
atletas magoados, irritam-se. Os professores, como treinadores, mal
compreendidos, fazem o mesmo. Os pais, que são os mais fervorosos adeptos,
invadem o campo. Não é raro jogarem todos contra todos.
As próprias férias são
competitivas. Pergunta-se aos miúdos que férias tiveram e o desgraçado que não
viajou, que não consumiu, é um falhado social. Como o é aquele que não tem
Iphone ou Ipad ou roupa de marca. Desde cedo se ensina que a escadaria social
importa.
Vivemos uma competição desregrada,
mas sobretudo inútil porque estéril. O meu filho perguntou-me (por ocasião do
desaire escolar de um amigo) se eu gostaria dele igualmente caso ele não fosse
bom aluno. Ele gostaria de mim se eu não fosse professora da universidade? Ele
ficou muito surpreendido, porque gostar de mim não tem nada a ver com a minha
profissão. Pois eu gostar dele também em nada se relaciona com ele andar na
escola a aprender… e a brincar, esfolar-se, arranjar namoradas, confundir
vespas com abelhas, brigar e fazer as pazes com amigos e estragar as calças e
os sapatos mensalmente. Ainda que eu dispensasse este último item.