Recentemente, uma “polémica”
encheu as notícias sobre uma dupla da Rua Sésamo, Egas e Becas (em inglês Ernie
e Bernie). O criador dos bonecos, Mark Saltzman, disse que a dinâmica entre
Ernie e Bernie era a de um casal, melhor dizendo “lovers”. Isto foi tomado como
uma corajosa afirmação pró-sexualidade aberta, gay rights, educativa, enfim,
uma série de rótulos.
Vamos ser sérios. Os bonecos
existem desde o início dos anos 80, e agora Saltzman diz que sempre (sempre!)
foram namorados, mas ninguém teve coragem de explicitar (incluindo ele). Naquela
altura, não era assim tão comum assumir-se a homossexualidade – exceto Freddie Mercury e outros corajosos. Era a época da SIDA, da ignorância, “olha o
maricas”, etc. Agora, não só é comum como é moda, entrou no mainstream, é déjà vu. Hoje, cortam-te a cabeça socialmente se fores homofóbico. Portanto, Saltzman, deixa de ser cocó. Se
querias dizer algo, dissesses quando era necessário ter tomates para o fazer e
não agora quando é super fashion fazê-lo.
Mas esta não é a questão, sequer.
A questão é: porque é que, nos últimos anos, se assiste à necessidade de
inventar uma vida sexual para personagens unicamente destinadas ao
entretenimento infantil? As crianças não têm qualquer interesse nem neste tipo
de interação nem na orientação sexual de cada um. Costumam ver criancinhas a
perguntar se alguém é gay, hetero ou bissexual? Não. Simplesmente porque este é
um assunto que só interessa aos adultos. É uma ideia que só aflora o mundo
infantil quando foi lá plantada por um adulto. Porque terão os adultos
interesse em fazer tal implante? Ademais, porque tem a sociedade interesse
nisso? São questões que merecem ponderação
Uma breve pesquisa na net
demonstra que estes mesmos bonecos que ensinam os miúdos da pré-escola a contar
já foram usados em protesto numa petição online em 2011 que requeria um
casamento na Rua Sésamo entre Ernie e Bernie
– não será necessário um génio para saber que os autores e signatários
da petição não foram crianças, embora (e tenhamos sempre isto em mente!) os
espetadores da Rua Sésamo o sejam. Uma decisão do Supremo Tribunal de Nova
Iorque sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo foi noticiada com uma foto
de Ernie e Bernie em 2013. Inocente? Só para quem não perceber de marketing ou
de psicologia.
Mas não se trata apenas de Ernie
e Bernie. Os desenhos animados Sailor Moon, por exemplo, já há muito que têm
pares homossexuais de homens e mulheres e fóruns onde estas relações são
discutidas ao pormenor. Novamente: os desenhos animados são para crianças,
supostamente, mas estes fóruns na net são mantidos por adultos… as crianças não
têm interesse em saber se a Sailor Uranus é secretamente interessada nos dois
sexos, se é trans ou que raio se passa dentro das suas cuecas. O que interessa
às crianças na Sailor Moon é apenas a magia das miúdas que se transformam em
guerreiras.
Se vamos extremar as relações dos
desenhos animados, arrogo-me o direito de me interrogar agora sobre as relações
entre o Snoopy e o Charlie Brown, entre o Garfield e o Jon, entre o Wallace e o
Gromit. Será zoofilia? E que dizer da
Heidi e do avô, da obsessão do pai do Pinóquio para ter um filho com aquele
suspeito narizinho? Acho que o melhor é ficarmos por aqui e deixar o mundo dos
miúdos com direito a ser crianças… sem sexualidade prematura imposta à força.