Muita tinta fez correr Emile
Ratelband, o holandês de 69 anos que decidiu encetar um processo judicial para
que passasse a constar nos seus documentos que tem menos 20 anos do que
realmente tem. Ratelband alega que a sua idade, com a qual não se identifica
nem física nem psicologicamente, o impede tanto de arranjar emprego como lhe
dificulta a vida amorosa, sendo que ambas as coisas ficariam sanadas se a
perceção que os futuros empregadores e futuras namoradas tivessem dele fosse a
de alguém mais jovem. Ratelband apresenta, ainda, relatórios médicos que
atestam a sua excelente forma física. Ademais, protesta que o seu caso judicial
não é substancialmente diferente do de outras pessoas que decidiram mudar de
identidade – simplesmente, nunca antes alguém tinha protestado para mudar
“apenas” a sua idade. Mas mudar de género já hoje se tornou comum, baseado na
premissa “não me identifico com o género que tenho”, o que dá direito a mudar
os documentos que se tem. Assim, Ratelband alega que tendo ele esta mesma
razão, ademais sustentada pela medicina e razões de ordem prático-financeira e
emocional, porque não pode fazer o mesmo quanto à idade?
A comunidade LGBTI tem acusado
Ratelband de estar a fazer troça da grande conquista LGBTI de poder mudar de
identidade legalmente. Porém, seguindo a lógica, Ratelband tem uma ambição:
também ele quer mudar, não de género, mas de idade, e usa argumentos
pragmáticos. Se podem outros, porque não ele? Não me parece troça, mas sim
constatação para tentar ganhar o pretendido. Aliás, o tempo (e
consequentemente, a idade) é uma construção do homem, que criou os calendários
e cuja idade é medida de forma diferente consoante a cultura em que está. Já
antes neste espaço expliquei que uma criança de um mês em Portugal pode ter
dois anos na China, onde o tempo se mede de forma diferente… Logo, não me choca
este pedido nem vejo a idade como algo escrito na rocha mas sim na areia.
Já em 2015, um canadiano de 52
anos, mudou de idade e de género, por alegadamente se identificar como menina…
passando a viver como filha adotiva de uma família, na pele de uma menina de 6
anos. Mas aí, ninguém reclamou, todos acharam muito correto, porque reclamar
seria, essencialmente, ir contra a identidade transgénero. A mim, porém, é esse
caso que me põe reticências, não só porque o facto de alguém na meia idade
querer voltar à infância me parece
patológico mas porque acho perigoso deixar esta pessoa em atividades com
os reais miúdos de 6 anos, pois quem pode afirmar quais são as motivações que ele
teve para assim se colocar livremente no mundo infantil como se fosse um dos
pequeninos?
Quanto a outras mudanças de
identidade, o mundo em que hoje vivemos é plural e fácil. Em Portugal, não é
fácil mudar de nome – há que fazer um requerimento que passa pelo Presidente da
República – mas noutros países, é o pão de cada dia; basta pagar uma pequena
taxa e nem tem de se apresentar uma razão. Também se pode mudar o nome dos
filhos, alegando que pensámos melhor e já não gostamos do anterior. Quanto a
nacionalidades, pode-se acumular duas ou três, desde há muito. Já nem falo de mudanças
tão volúveis como o estado civil. Locais há onde as próprias crianças podem
decidir ser adotadas desde que tenham 10 anos, sem necessitarem do
consentimento dos progenitores biológicos. Portanto, definitivamente, a identidade
já não é o que era neste maravilhoso mundo novo.
Se a Justiça serve a realidade, e não o contrário, como afirmam os LGBTI, então Ratelband tem razão: o mundo mudou há muito. Sirva-se essa igualdade a todos os insatisfeitos até porque, com tal mudança, ninguém se magoa.
Se a Justiça serve a realidade, e não o contrário, como afirmam os LGBTI, então Ratelband tem razão: o mundo mudou há muito. Sirva-se essa igualdade a todos os insatisfeitos até porque, com tal mudança, ninguém se magoa.