... "And now for something completely different" Monty Python

Thursday, January 3, 2019

Cegueira de Escolha



Suspeito que 2019 seja ano de eleições para algo, pois raro é o ano que não o é, já que há uma multiplicidade de cargos (não sei o que alguns trazem de novo, mas isso seria outra crónica).

Como tal, quero falar-vos de uma experiência da Universidade de Lund – a universidade mais bem cotada da Suécia, entre as melhores do mundo – que se intitula “Choice Blindness”. Lá, existe um laboratório de Ciência Cognitiva onde, desde 2005 até hoje, Peter Johansson, Lars Hall e outros estudam este fenómeno de cegueira de escolha e mudanças de atitude transformativas. Trata-se de perceber o fenómeno da escolha individual: até que ponto o indivíduo tem consciência plena da sua escolha e, segundo esse plano racional, porque a defende. Naturalmente isto aplica-se a todos os campos da vida, não somente à política, mas à vida pessoal, profissional, etc.

As primeiras experiências foram simples. Apresentaram-se aos sujeitos duas fotografias, para que escolhessem o rosto mais atraente. Escolhido um, tinham de justificar a sua escolha. Posteriormente, foi feito um truque, acabando os sujeitos por ficar com o rosto que tinham rejeitado. Surpreendentemente, quase ninguém reclamou (e raros deram por isso). Em seguida, foi pedido aos sujeitos para justificarem porque gostavam mais do rosto que tinham à frente. De notar que todos justificavam muito bem. Por ex: “Escolhi este porque gosto mais de morenas” (sendo que, na verdade, tinham inicialmente escolhido o rosto de uma loira que lhes tinha sido retirado!) Os resultados mostraram que, em 75% dos casos, as pessoas fantasiaram razões para os rostos que lhes calharam e que, recordo, na verdade não tinham escolhido. Tão bem o fizeram que acreditaram terem sido eles a escolher este resultado! Para “picar” os sujeitos, foi-lhes perguntado se seriam capazes de notar algum tipo de manipulação indevida na experiência. 84% responderam que sim. Finalmente, quando confrontados com a sua escolha correcta (i.e. a inicial) rejeitaram-na. 

Isto é “choice blindness”, ou, se quisermos, manipulação das nossas escolhas e a nossa própria fantasia justificativa de que estamos a escolher o que, na verdade, nunca escolhemos. Parece incrível mas raras são as pessoas que escapam a isto, por pura pressão social.

Claro que experiências posteriores incluiram questões bem mais complexas do que rostos. Uma experiência interessante intitulava-se “Levantando o Véu da Moralidade” e jogava com questões éticas. As pessoas são capazes de mudar as suas opiniões sobre questões morais, com o mesmo simples “truque de cartas” usado na experiência dos rostos, e fazem-no com a mesma rapidez e de forma assumidamente descomprometida (quanto à escolha inicial, a sua) e ferozmente defensora (quanto à segunda escolha, que passam a ver como sua).

O mesmo se passa quanto a opções de natureza política, comprovado com outra experiência, que mostrou que estas opções não são construídas mas sim assumidas, sem qualquer argumento racional, e sim por simples persuasão íntima, cuja natureza é rápida e variável, embora não tida como tal pelo indivíduo.

Mais se comprovou que os efeitos desta “cegueira de escolha” podem não raro influenciar futuras escolhas e julgamentos. Quanto mais justificativas os sujeitos davam para as escolhas finais das experiências (que não tinham sido as suas, mas que agora assumiam, inequivocamente, como tal) mais hipóteses tinham de para sempre assumir estas “novas” hipóteses como sendo mesmo suas futuramente e, assim, agarrar-se a elas. Esta ideia, denominada auto-feedback, cria raizes no facto dos indivíduos terem tendência a continuar a assumir o que já disseram publicamente (isto piora na proporção de quanto mais publicamente um assunto foi dito ou quanto mais pública determinada figura é, como se calcula).

Claro que certas questões paralelas são interessantes aqui, como seja a questão do debate. No fundo, e de acordo com estes resultados, notamos que a generalidade das pessoas não debate para discutir a sua ideia ou convicção mas tão só para fervorosamente “ficar por cima” pois, quantas vezes, nem tão pouco estará certo de qual é a “sua” ideia! Podia ser outra qualquer que a defenderia da mesma forma, desde que ganhasse!

Porém, Johansson e Hall admitem que há excepções à “cegueira de escolha”. Existem indivíduos que resistem à pressão. Para tal, basta-lhes usar de senso comum e da coragem de manter a sua individualidade.

Tenhamos, todos, um 2019 de olhos bem abertos.