Já ouviram dizer “O Natal é quando um homem quiser”? Parece que o Dia dos Namorados também. Este último com maior razão, porque não tem a mesma data em todo o planeta. Namorados, atentai: caso queiram celebrar estas datas todas, saibam que elas estão convenientemente espalhadas no calendário para que nunca se apague a chama de que já falava Dido na Eneida.
A razão pela qual me lembrei disto agora é que o Dia dos Namorados se
celebra no Verão aqui onde moro. Mas começo pelo Brasil, que celebra a data em
Junho. Isto ocorre no país desde 1948; é uma tradição já bem enraizada. Não
deixa de ser curioso que, estando os brasileiros bem próximo dos Estados
Unidos, tenham escolhido outra data para a celebração do seu Dia dos Namorados,
resistindo à invasiva e persistente influência americana.
Tudo começou por causa dos portugueses. Os lisboetas sabem a importância do
Santo António, padroeiro de Lisboa, que dá à cidade o feriado municipal de 13
de Junho. Na noite anterior, as ruas de Lisboa estão cheias de balões, marchas,
sardinhas assadas na brasa e manjericos com quadras populares. O Santo António
é, tradicionalmente, o santo casamenteiro. Não só existe a tradição dos
casamentos comunais que ainda hoje se practicam em Lisboa – as “noivas de Santo
António” – como há diversas lendas que o catalogam como padroeiro dos
casalinhos. É desta devoção ritualística ao Santo que nasce a ideia brasileira
do Dia dos Namorados a 12 de Junho.
Porém, não podemos esquecer que o Dia dos Namorados tal como hoje se
vivencia é puro marketing. A religião só deu o empurrão. A verdadeira motivação
foi incentivar o volume de vendas das lojas, já que estas, em Junho,
apresentavam o maior défice de todo o ano. Foi assim que em 1948, o
publicitário brasileiro João Dória, dono de uma agência de marketing, organizou
uma imensa campanha para promover esse Dia dos Namorados em Junho… com tanto
sucesso que, ano após ano, o dia se vem mantendo no Brasil inteiro. Com criativos
assim, não há depressões económicas.
Na China e em Taiwan, o Dia dos Namorados é no Verão. Aliás, na China há
seis datas que configuram o “Dia dos Namorados” porque as mulheres chinesas não
são para brincadeiras no que respeita a receber prendas materiais– mas isso
demora muito a explicar. O que usualmente se designa como Dia dos Namorados é o
“Duplo Sete” ou “Festival Qixi”, que calha no dia sete do sétimo mês – o
calendário é lunisolar, portanto variável, porém geralmente até acontece em
Agosto. Não é um Dia mas sim uma Noite dos Namorados, simbolizando o encontro
de duas estrelas que são os namorados celestes: Vega e Altair, que “se olham
sem poder comunicar”.
A lenda diz que Altair era um órfão que pastoreava uma vaca falante. A vaca
disse-lhe que ele veria uma fada vinda dos céus. A fada, nada menos do que
Vega, era uma tecedeira celestial, que o visitou, e que sempre tinha de
regressar ao reino celeste. Os dois apaixonaram-se, mas o imperador dos céus
proibiu-os de se encontrarem. Para melhor dificultar, colocou uma galáxia entre
ambos. Porém, como Altair era persistente acabou por se transformar em estrela.
Há apenas uma noite onde conseguem estar frente a frente. Essa é a Noite dos
Namorados. Como veem, as lendas chinesas são muito dramáticas e nem sempre
acabam bem.
Por último, não quero deixar de mencionar o famoso Valentine’s que, na
realidade, começou por ser San Valentino, já que o Santo era romano e,
inclusive, bispo. Contra as ordens do Imperador da época – que acreditava que o
celibato tornava os homens melhores combatentes - Valentim celebrava casamentos
e era muito apreciado por todos os parzinhos. Foi encarcerado pela sua
desobediência e aqui começa uma lenda que nos diz que o próprio Valentim se
apaixonou pela filha de um dos carcereiros. A jovem deixou de ser cega pela acção
milagrosa do amor de Valentim. Isto não o livrou da morte, mas consta que terá
escrito várias cartas à sua amada.
A tradição das cartas viria a ser recuperada na Idade Média, altura em que
se começou a celebrar o Dia dos Namorados na data da morte de Valentim, data
que, em Fevereiro, coincidia com o acasalamento dos passarinhos e anunciava a
fecundidade. Daqui até ao marketing de cartões, flores, bombons e cupidos de
hoje foi um beijinho.
Não faltam, assim, dias para celebrar o namoro… ou os namoros. Isto porque,
se algum dos leitores for como o meu avô, que chegou a ter três namoradas ao
mesmo tempo, a logística complica-se. Sobretudo agora com a internet. É um
passaporte via única com destino à desgraça.