... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, August 31, 2012

"Deixai Vir a Mim as Criancinhas"



As campanhas eleitorais não trazem nunca à tona o que há de melhor nas pessoas. Trazem os melhores sorrisos e as palavras mais cândidas, seguramente, mas há que ter sempre presente que a intenção dos candidatos é levar o povo a dar-lhes o seu voto, pelo que – passe a dureza da expressão – o que cada candidato está a fazer é a vender-se e, consequentemente, tem de apresentar o seu lado mais atraente, a sua melhor promessa, o seu melhor discurso regado a Colgate. Ninguém nos vende uma casa sem pintar as manchas de bolor que daqui a 5 meses nos vão, fatalmente, voltar a aparecer nas paredes.
Mas isto é óbvio, expectável e compreensível. Faz parte.

O que não devia fazer parte dessa auto-promoção fatal é a utilização de menores. Falo, concretamente, do uso de crianças nas campanhas eleitorais. Poucas coisas me revoltam tanto como o abuso de criancinhas, e esta é, quer queiramos quer não, uma forma de abuso. Se não, vejamos: está-se a usar a imagem e / ou a presença de um menor, que não faz ideia daquilo para o qual está a contribuir (pois ainda que grite o nome do partido porque lho mandaram fazer é mais do que claro que o menor não tem qualquer noção nem do ideal nem do que um voto acarreta, se é que compreende o sistema tão pouco). Não raras são as campanhas que o fazem. De facto, existem mesmo aquelas que pedem a crianças para se juntarem para tirar fotografias para a página do partido ou para distribuição nas redes sociais, que se juntem a gritar o nome do partido quando a televisão aparecer, enfim… Se se portarem bem, ganham um boné. Mal comparado, e desde já me perdoem o extenso exagero, a prostituição funciona um bocado assim – mas as consequências são, obviamente, bastante mais gravosas, tanto física como psicologicamente.

Isto é negócio antigo e vezeiro. Na campanha para as presidenciais dos E.U.A., a Sra Sarah Palin, experiente na política, não ignorava que a utilização de crianças e de desprotegidos é uma arma eficaz de campanha. Não se coibiu de usar a própria filha, que tem Síndroma de Down, e de andar com ela, acima e abaixo (nunca, nem antes nem depois, se viu a Sra Palin tantas vezes com a dita menina!), provando ser uma mãe extremosa e demonstrando que sentia na pele os problemas não só das mamãs mas das mamãs com filhos deficientes. Politicamente, não resultou porque a sra levou o embuste um bocado longe e o povo fartou-se de tanta aparição com a filha debaixo do braço… mas podia bem ter dado certo. Aliás, várias estações de TV fizeram piadas sardónicas (pós-campanha, naturalmente) ao ataque súbito de maternidade da Sra Palin, e a série Family Guy dedicou um episódio à filha, criando-lhe uma personagem, sendo imediatamente processada pela ex-governadora (que perdeu o processo, pois não tinha sido ela a primeira a usar e a ridicularizar a imagem do seu rebento para fins auto-promocionais?)

Sou totalmente contra o uso de crianças em comícios, campanhas, reuniões partidárias, festas de apoio, e tudo o que se relacione, sejam de que partido forem. “Uso” é a palavra certa. Tem sido esta uma grande batalha minha – infelizmente, pouco conseguida, lamento dizer. Avós, pais, tios, todos têm direito a proclamarem a sua visão e a promoverem-se, mas deixem de parte os meninos. Deixem-lhes o direito a ter infância.