Confesso: nunca tive paciência
para os livros, artigos e filosofia dessa onda neo-psico-positivista de pacote.
É o género “Hey, tu aí!” que ostenta um sorriso Colgate e nos tenta convencer
que sorrindo e gritando “Hey!” ficamos automaticamente felizes também. É a
malta que acredita que não há pessoas negativas; somos todos positivos se
acendermos umas velas perfumadas e massajarmos os pontos certos. É também
aquela malta que acha que as pessoas positivas nunca têm pólo negativo, estão
sempre num carrocel de gozo, prontas a almoçar (saudavelmente!), subir
montanhas, colorir a vida e fazer prova no Instagram.
Por causa da ideia de que temos
todos de estar sempre 100% ativos e 100% positivos, as pessoas não aguentam o
silêncio e a tranquilidade. Menos ainda se aguenta a ideia de sentir uma emoção
negativa, qualquer que ela seja. “O que é que se passa? Estarei doente? Será
que me vão levar ao psiquiatra e diagnosticar como anormal? Pelo sim, pelo não,
o melhor é não dizer nada a ninguém.” E não dizem. Vão roendo aquilo, o mais
disfarçadamente possível, no meio de muitos “ahahaha”, ditos o mais alto
possível.
À conta disso, vendem-se centenas
de livros denominados de auto-ajuda que ensinam as pessoas a serem felizes (agora
sim, ahahaha!). Mas há aquelas raras pessoas que falam com os amigos. Esse
método antigo (e pasme-se, sempre eficaz!) ainda se usa. Mas também há aqueles
“amigos” que nos mandam logo ao médico. Desses, há que desconfiar e mandá-los
ler um livro muito engraçado que se opõe à onda de auto-ajuda – chama-se “Stand
Firm: Resist the Self Improvement Craze” de Svend Brinkmann, psicólogo
dinamarquês, que se traduz mais ou menos assim “Mantem-te Firme: Resiste à
Maluqueira do Auto-Aperfeiçoamento”.
Tens crises existenciais?
Parabéns, és um tipo normal. A tua vida é difícil? Bem-vindo ao mundo. Não te
achas especial? Ninguém é tão especial como a sua mãezinha lhe disse nem tão
pouco especial como o seu patrão o julga. Aceita as tuas limitações e, ao mesmo
tempo, vê bem a quantidade de coisas boas que te envolvem.
Não é normal não ter emoções
negativas. É tão anormal como tê-las sempre.
De facto, seria irreal esperar que as pessoas não reagissem com emoções
negativas quando confrontadas com acontecimentos muito negativos na vida.
Lembro-me de ver uma entrevista do ator Keanu Reeves, após morrerem a sua namorada
e a sua filha, a quem perguntaram se tinha ficado deprimido. Ele respondeu “As
pessoas não “ficam” deprimidas. Reagem ao que lhes acontece.” De facto, assim
é. Por essa razão, desconfio dos que nunca reagem: a insensibilidade só pode
significar um trauma demasiado profundo para ser expresso ou então uma real
incapacidade de sentir emoções. Esta última é a mais assustadora. Mas existe.
Sentimentos negativos fazem parte
da roda. Têm de ser “abraçados” para ser ultrapassados, ou, pelo menos, para
convivermos com eles. Há uma TedTalk interessante de Susan David, psicóloga de
Harvard, que nos fala dessa coragem emocional. Enfrentar o que se sente, seja
amor, tristeza ou raiva é um ato de coragem, nem sempre fácil, mas caminho
único para o sossego interior.
Pensem também nesta citação de
Mark Manson (com perdão do título do livro, que nunca li): “O desejo de ter
experiências mais positivas é, em si mesmo, uma experiência negativa. Paradoxalmente,
a aceitação de uma experiência negativa é, em si mesma, uma experiência
positiva.” (The Subtle Art of Not Giving a F*ck)