... "And now for something completely different" Monty Python

Friday, March 1, 2019

Ana Filipa



Só a conhecem por este nome fora do mediatismo. Nos meios de comunicação social, era Esmeralda. “O caso Esmeralda” alimentou tribunais, notícias e opiniões durante anos até ser esquecido quando a menina de 8 anos foi entregue ao pai biológico em 2008. Era um caso que levantava no público desejos escondidos de punição e de moralismo burocrático sem conexão com a realidade. Mas Ana Filipa não era um “caso” e sim uma criança, com sentimentos e ideias claras. Recentemente, uma notícia deu a conhecer que “Esmeralda”, hoje com 17 anos, já vive há quase dois anos com o “casal de pais afetivos” a quem foi arrancada na altura. Saiu de casa do pai no Verão de 2017 e desta vez não houve aparato que a obrigasse a voltar ao que nunca quis.  Este “falhanço” daquilo que se considerou ser o “superior interesse” da menina – claramente contestado e negado pela própria assim que pôde - foi muito habilmente silenciado. Não é por acaso que não se vêm notícias a dizer que “Esmeralda” deu um pontapé à vida que lhe impuseram. Assim, o sistema progride, desconstruindo vidas e infâncias.

Esmeralda foi, realmente, o nome que lhe deram quando nasceu. A mãe entregou-a com três meses ao cuidado de um casal, pais que ela passou a conhecer como seus e que a re-baptizaram como Ana Filipa. O casal fez o capital pecado de não adotar formalmente a menina, embora se inscrevesse para tal na Segurança Social. Aqui começou a sua desobediência ao Estado. O pai de “Esmeralda” não a reconheceu como sua aquando do nascimento, demorando a perícia genética a oferecer resultados. Foi aos 4 anos da menina que a biologia se revelou, dando a confirmação do progenitor. Aí, o pai decidiu que a queria. Começou aqui um torturante processo legal que durou quatro anos para se completar. De não querida (em todos os sentidos), “Esmeralda” passou a ser desejada por todos: agora tanto os pais afetivos, como o pai biológico e também a mãe biológica disputavam a sua guarda em Tribunal.

Advogados de renome criticaram “o acordo” feito entre o casal e a mãe biológica, a “recusa sistemática” do casal em deixar a menina ir para o pai biológico (contrariamente à ordem do Tribunal), e a inércia do sistema em acelerar para que “Esmeralda” fosse viver com o pai, a quem o Tribunal rapidamente confiou a guarda, antecedida por um sistema de visitas “para que se fosse habituando à presença” do que era um estranho. É curioso que estes iluminados não critiquem, por exemplo, o acordo de Cristiano Ronaldo quando compra um filho (tanto mais razão teriam para o fazer sendo que, no seu caso, se trata de um contrato que envolve dinheiro); estranho, também, que critiquem a proteção dada a uma criança que, por razões óbvias, não queria mudar de vida.

Nesta história, o pai afetivo foi condenado a dois anos de prisão suspensa por subtração de menores (pois o casal chegou a esconder “Esmeralda”, novamente desobedecendo ao Tribunal que tanto primou pelo “superior interesse da criança”). O pai biológico obteve a guarda da menina e ainda uma indemnização de 15.000 euros do Estado, aquando de uma decisão do TEDH, que criticou a morosidade do processo. Mas… ganhou? A julgar pelos últimos acontecimentos, “ganhou” uma filha que não parece ter por ele bons sentimentos.

Hoje, talvez fosse diferente. A lei europeia obriga à audição das crianças para que exista uma mudança de guarda, bem como a ter-se a opinião da criança em conta. Porém, é certo que os tribunais desrespeitam com frequência certas leis que Portugal consignou.

O que é mais que certo é a lição a retirar deste “caso”: não vale a pena contrariar o coração. À primeira oportunidade, ele exibe a sua revolta. O Amor não se promove por sentença; ele é Lei ou então nem existe.